Há duas coisas que nunca me esquecerei.
Uma é o momento em que as chamas chegam pela primeira vez ao perímetro urbano da vila.
Aquela aflição das pessoas, aquela sensação de que estava a assistir a algo inimaginável. Depois houve o momento em que passei pela primeira vez pela estrada nacional 266 para visitar as aldeias afetadas.
Um vento terrível, as chamas ao fundo, um cenário de apocalipse, com árvores queimadas e a terra fumegar.
É uma coisa de filme, não da realidade - e muito menos na nossa terra.
Calculava há dois dias 10 milhões de euros de prejuízos diretos. Nos últimos dias foi visitado pelo primeiro-ministro e pelo Presidente da República. Teve as garantias de que precisava?
Estes dez milhões são para as coisas básicas, as emergências.
Recuperar casas, placas sinaléticas, contentores de lixo e estradas.
Não estou a contabilizar nestes valores as perdas que as pessoas sofreram.
Nos últimos dias tivemos aqui políticos, jornalistas, representantes de tudo e mais alguma coisa.
Mas hoje é o primeiro dia de solidão, é o dia zero em que começa o processo da cura. Espero que não seja um processo solitário, que consiga ter acesso a reuniões urgentes e eficientes com as várias pastas do governo.
Sobretudo, espero que deixem lá fora a habitual mochila de burocracia.
O incêndio de Monchique foi um acontecimento excecional, então merece medidas excecionais também.
Qual é agora a prioridade?
Claro que temos de cuidar dos problemas emergentes das pessoas, mas para mim o mais importante agora é criar um plano de restruturação da serra de Monchique.
Quero juntar-me com os municípios vizinhos para concertarmos os esforços.
Hoje, viver na floresta significa correr perigo de vida.
E chega, isto não pode continuar a ser assim.
Mas esse discurso existiu depois dos incêndios de 2003 e 2016. E não resultou.
Depois disto, penso que toda a gente tem a noção de que esta é a última oportunidade para a serra.
Temos de diversificar a nossa floresta, apostar em espécies autóctones resilientes aos fogo.
Não podemos continuar a explorar uma monocultura porque as consequências estão à vista.
Há eucaliptais ordenados, sim, mas também os há nas margens dos ribeiros, nos lugares dos medronhais.
Isto tem de ser travado.
Se for preciso, arrancaremos eucaliptos.
O seu concelho tem 500 produtores florestais, quase todos de eucalipto. Como é que os vai convencer a arrancar árvores?
Não o quero fazer sozinho, um plano destes tem de envolver todos os municípios da serra e as autoridades centrais.
Mas, depois deste fogo, estou disposto a ir até às últimas consequências.
Ainda para mais, este é o meu último mandato à frente da autarquia.
Não me importo de tomar medidas impopulares, se elas significarem que o povo pode viver seguro na floresta.
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