quarta-feira, 24 de outubro de 2018

PS ainda conta com PSD para aprovar alterações às rendas

Habitação e Urbanismo
Filomena Lança   23 de outubro de 2018 às 22:15


















Os socialistas pediram a suspensão das votações das propostas do Governo e lançaram um novo apelo ao Bloco, ao PCP e ao PSD, sendo certo que os comunistas estão irredutíveis.

O PS conseguiu esta terça-feira o apoio do PSD para conseguir a suspensão das votações do pacote do arrendamento urbano, em discussão no Parlamento. 
Os dois partidos votaram favoravelmente o requerimento socialista para que os trabalhos ficassem suspensos até ao fim do processo legislativo do Orçamento do Estado (OE) para 2019, também em curso na Assembleia da República, e que fossem retomados no início de Dezembro. 
A esquerda votou contra e o CDS-PP também.

"Para conseguir transformar propostas em lei, temos de garantir uma maioria que vote favoravelmente estas medidas", afirmou o deputado socialista João Paulo Correia em declarações aos jornalistas. 
"A pressa não pode ser inimiga da boa lei e precisávamos de debater durante mais algumas semanas com os outros partidos, nomeadamente o PCP e Bloco, mas também com o PSD, se estiver disponível", justificou-se.

As votações estavam agendadas para ontem na reunião do grupo de trabalho para as temáticas de habitação, devendo depois ser ratificadas na Comissão de Ambiente. 
No entanto, cedo se percebeu que as propostas do Governo que alteravam a lei das rendas, criavam o arrendamento acessível e baixavam o IRS nos contratos de longa duração seriam chumbadas. 
O PCP votaria contra e à direita nem o PSD nem o CDS-PP se mostraram disponíveis para viabilizar o pacote.

A solução encontrada pelos socialistas foi um pedido de adiamento, mas João Paulo Correia, vice-presidente da bancada parlamentar que excepcionalmente esteve presente na reunião do grupo de trabalho continua a assegurar que o propósito socialista é ter as novas regras aprovadas e a entrar em vigor a 1 de janeiro de 2019. 
E o facto de estas terem implicações orçamentais não o preocupa: está tudo previsto na proposta de OE para 2019, por isso não haverá problemas com a lei travão, que proíbe os deputados de aprovarem leis com impacto orçamental durante a vigência de um OE.

A opção socialista levou já à demissão de Helena Roseta do cargo de coordenadora do grupo de trabalho da Habitação. 
A deputada votou contra o requerimento socialista afirmando que  o seu "dever de consciência" era "não adiar uma coisa que considero que é urgentíssima". 
E não poupou nas críticas aos colegas de bancada, defendendo que "se uma vez que um partido não tem a maioria pede o adiamento, está a prejudicar os trabalhos parlamentares". 
Cabe agora ao PS designar o novo coordenador do grupo de trabalho, o que deverá acontecer até ao final desta semana.

As mudanças às rendas já aprovadas no Parlamento

Habitação e Urbanismo
Filomena Lança    18 de outubro de 2018 às 10:30



















No primeiro dia de votações indiciárias, os deputados do grupo de trabalho para as matérias da habitação aprovaram já um conjunto de alterações de entre as várias propostas em cima da mesa, apresentadas pelo Governo e pelos partidos.

Indemnização em caso de mora baixa
Se o inquilino se atrasar no pagamento das rendas terá de pagar uma indemnização no valor de 20% do montante em dívida. 
É uma redução face aos 50% agora previstos na lei. 
Por outro lado, havendo fiador, este terá de ser informado da mora pelo senhorio, o qual deve indicar as quantias em dívida e tem de o fazer no prazo de 90 dias.

Forma do contrato com novas regras
Até agora a lei só prevê que tem de ser por escrito. 
Para o futuro, se não existir contrato escrito por causa não imputável ao inquilino, então este pode provar que existe um contrato, seja exibindo o recibo de renda, ou provando que usou o imóvel sem oposição do senhorio e que pagou mensalmente a renda por um período de seis meses. 
Era uma proposta do PCP que foi aprovada.

Fundamentos para a resolução
O senhorio só pode resolver o contrato se tiver informado o inquilino de que tem essa intenção por carta registada com aviso de recepção depois do terceiro atraso no pagamento renda. 
Uma proposta do CDS-PP que foi aprovada.

Denúncia do contrato 
No caso dos contratos de duração indeterminada, as regras são mais apertadas se a causa for a demolição ou a realização de obras de remodelação ou restauro profundo – aqui, o senhorio passa a apenas poder denunciar o contrato se das obras não resulta um local de idênticas características e onde seja possível a manutenção do arrendamento.

Por outro lado, o Parlamento aprovou uma proposta do PCP, segundo a qual para o senhorio denunciar um contrato sem ter uma razão para o fazer – porque precisa da casa para si, por exemplo – terá de o comunicar ao inquilino com uma antecedência de cinco anos sobre a data em que pretenda a cessação – hoje em dia são dois anos.

Indemnização isenta de IRS
A lei passa a prever uma isenção fiscal para as indemnizações pagas aos inquilinos nos casos em que o proprietário queira denunciar o contrato de arrendamento porque precisa da casa para sua habitação própria ou dos filhos. 
As indemnizações aos inquilinos estão actualmente sujeitas a IRS, uma vez que se consideram rendimentos da categoria G, de mais-valias, no âmbito das indemnizações devidas por renúncia onerosa a posições contratuais ou outros direitos inerentes a contratos relativos a bens imóveis.

Transmissão por morte
Cai a exigência que existe actualmente de que, para haver transmissão do arrendamento por morte do arrendatário, quem lhe sucede resida na casa há mais de um ano. 
Neste campo, uma outra novidade, esta decorrente de uma proposta do PCP aceite pelo PS e que teve também os votos favoráveis do Bloco: estipula-se que o contrato não caduca por morte se viver na casa um descendente com mais de 65 anos de idade.

Deficientes mais protegidos
É uma proposta do Bloco de Esquerda que foi aprovada na votação indiciária e que estipula que, nas rendas antigas,  as regras já previstas para os inquilinos com mais de 65 anos ou com deficiência igual ou superior a 60% passam também a aplicar-se se o arrendatário não reunir nenhuma destas condições, mas se do agregado fizer parte uma pessoa com grau de deficiência de 60% ou mais.

O Bloco queria que as regras se estendessem também aos casos em que o arrendatário invocasse e comprovasse que no seu agregado vivia pessoa com idade igual ou acima de 65 anos, mas PS, PSD e CDS-PP votaram contra e a ideia ficou pelo caminho.

PS pede suspensão da votação das alterações às rendas. Helena Roseta demite-se do grupo de trabalho

Habitação e Urbanismo
Filomena Lança    23 de outubro de 2018 às 10:51





















O PS pediu esta terça feira a suspensão da votação das três propostas de lei do Governo de alterações à lei das rendas, incluindo a criação do arrendamento acessível e a redução de IRS para os senhorios. 
Roseta votou contra e demitiu-se da coordenação do grupo de trabalho da habitação.

Alegando que está em causa "uma matéria muito complexa", que "exige muita ponderação", o grupo parlamentar do PS pediu esta terça-feira a suspensão do processo de votação do pacote de alterações ao arrendamento. 
Os socialistas lembraram que estão agora em curso os trabalhos do Orçamento do Estado (OE) para 2018  e pediram que as votações das alterações à lei das rendas fossem retomadas depois de terminado o processo de discussão orçamental, na primeira reunião a seguir à votação final global do OE.

O pedido de suspensão já se esperava, na medida em que, tal como o Negócios noticiou hoje, o PS ficou isolado, uma vez que o PSD e o CDS-PP juntaram-se ao PCP e decidiram votar contra as propostas de lei do Governo.

O requerimento socialista foi já aprovado numa primeira votação indiciária ainda na reunião do grupo de trabalho da habitação com os votos favoráveis do PE e do PSD e a oposição do PCP e do Bloco de Esquerda. 
O CDS-PP não esteve presente na reunião. 
Esta votação deverá agora ser ratificada em comissão na reunião prevista para esta terça-feira à tarde. 

Helena Roseta demite-se
Helena Roseta, que coordena o grupo de trabalho para as temáticas da habitação, acompanhou os votos no grupo de trabalho, onde a votação foi feita "por bancada", mas anunciou que em comissão, onde cada deputado poderá votar de forma independente, votará contra. 
"O meu dever de consciência é não adiar uma coisa que considero que é urgentíssima", afirmou em declarações aos jornalistas à margem dos trabalhos. 

Roseta, que é também presidente da Assembleia Municipal de Lisboa, lembrou ainda que Fernando Medina havia feito um apelo a que as alterações às rendas fossem rapidamente aprovadas no Parlamento, no seu discurso do 5 de Outubro. 
Não concordando com a posição do PS, a deputada anunciou ainda que apresentava a sua demissão da coordenação do grupo de trabalho da habitação. 
"Obviamente demito-me", disse, salientando que "se uma vez que um partido não tem a maioria pede o adiamento, está a prejudicar os trabalhos parlamentares".

Também o PCP e o Bloco salientaram a urgência da aprovação das medidas que estão em cima da mesa, desaprovando  a suspensão dos trabalhos. 
"Este adiamento não responde à situação de emergência social que se vive no mercado do arrendamento", sublinhou o bloquista Pedro Soares. 
"O BE vê com a maior preocupação este adiamento e não pode acompanhar o PS", sublinhou.

Paula Santos, do PCP, alertou para as consequências: o processo em causa "não vem de ontem" e as situações "de enorme pressão sobre as famílias" exigem a "tomada de medidas para proteger o direito à habitação"
Sendo que o calendário inicialmente previsto era a anterior legislatura, o "PCP não pode acompanhar a proposta do PS de novo adiamento dos trabalhos", afirmou igualmente.

Já o PSD acabaria por admitir que o processo exige mais tempo e, assim sendo, votou favoravelmente o pedido de suspensão dos trabalhos.

"Proposta de OE já prevê estas medidas"
Apesar de remeter a votação das alterações às rendas para depois da aprovação final do Orçamento do Estado para o próximo ano, o PS mantem-se optimista na sua aprovação.

No final da reunião, João Paulo Correia, vice-presidente do grupo parlamentar do PS que esteve excepcionalmente presente na reunião do grupo de trabalho, explicou que as propostas de lei do Governo cuja votação foi agora adiada já estão acomodadas na proposta de OE "nos mapas da receita e da despesa"
Isso significa, entende, que não se colocarão aqui os problemas derivados da chamada Lei travão, que impede os deputados de aprovarem leis que tenham implicações orçamentais durante a vigência de um Orçamento do Estado.

"Para conseguir transformar propostas em lei, temos de garantir uma maioria que vote favoravelmente estas medidas", afirmou. 
"A pressa não pode ser inimiga da boa lei e precisávamos de debater durante mais algumas semanas com os outros partidos, nomeadamente o PCP e Bloco, mas também com o PSD, se estiver disponível".

"No início de Dezembro estaremos em condições para votar todas estas propostas", afirmou ainda o deputado, salientando que o objectivo é que os diplomas estejam prontos para entrar em vigor a 1 de Janeiro de 2019.

(notícia actualizada às 11:44 com nova informação)

PS afasta Helena Roseta do grupo de trabalho para a habitação

HABITAÇÃO E URBANISMO
Observador
24/10/2018, 15:53
PS afastou Helena Roseta do grupo de trabalho parlamentar para a habitação.

Helena Roseta recebeu um mail do chefe de gabinete da bancada parlamentar do PS poucas horas depois de anunciar a demissão de coordenadora do grupo de trabalho sobre habitação, em oposição ao partido.

Helena Roseta foi retirada pelo Partido Socialista (PS) do grupo parlamentar de trabalho sobre habitação, avança o Diário de Notícias. 
O afastamento acontece um dia depois de a socialista anunciar a sua demissão do lugar de coordenadora desse mesmo grupo, por discordar do pedido do seu próprio partido para adiar a votação das propostas do governo para mudar as regras de arrendamento.

Embora a sua demissão de coordenadora não implicasse a saída do grupo de trabalho, o partido decidiu à mesma retirá-la e substituí-la pelo deputado Hugo Pires, bem como à deputada Eurídice Pereira, cujo lugar será ocupado por Nuno Sá. 
A decisão foi comunicada a Helena Roseta por mail, assinado pelo chefe de gabinete do grupo parlamentar, e enviado às 00h41 desta quarta-feira, menos de 24 horas depois de a deputada socialista anunciar a sua decisão de renúncia.

“Da minha parte isto não altera nada”, declarou Roseta ao jornal, garantindo que continuará a colaborar com o PS e com o grupo de trabalho sobre a habitação. 
“Isso não me podem impedir”, reforçou. 
Recorde-se que a socialista deixou fortes críticas à forma como o PS geriu as negociações com os restantes parceiros políticos para fazer aprovar um pacote de medidas na área da habitação. 
No dia da votação, e antecipando a falta de maioria necessária para fazer passar as medidas propostas, os socialistas pediram para adiar a votação, o que empurra a discussão e a votação do grupo de trabalho para o final deste ano.






















domingo, 21 de outubro de 2018

EUA dizem que foi o príncipe herdeiro a ordenar captura do jornalista saudita desaparecido

ARÁBIA SAUDITA
Mariana Fernandes
11/10/2018, 14:03
Jamak Khashoggi está desaparecido desde o passado dia 2 de outubro

Segundo o Washington Post, foi o príncipe herdeiro da Arábia Saudita a ordenar a captura de Jamal Khashoggi, jornalista saudita desaparecido. Começam a surgir as identidades dos 15 homens envolvidos.

Terá sido o próprio Mohammed bin Salman, o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, a ordenar uma operação com o objetivo de atrair o jornalista Jamal Khashoggi e detê-lo. 
De acordo com o Washington Post, os serviços de inteligência dos Estados Unidos intercetaram comunicações entre cidadãos sauditas enquanto estes discutiam o plano e esta é mais uma prova do envolvimento do regime da Arábia Saudita no desaparecimento do jornalista no passado dia 2 de outubro, em Istambul, depois de ter entrado no consulado saudita na Turquia.

Jamal Khashoggi entrou no consulado da Arábia Saudita em Istambul e nunca mais ninguém soube do seu paradeiro. 
No mesmo dia, 15 elementos dos serviços secretos sauditas aterraram na Turquia em dois jatos privados, com hotel marcado para quatro noites — mas voltaram a sair do país no mesmo dia. 
Ninguém sabe o que foram lá fazer e, duas horas e meia depois de o jornalista ter entrado no consulado, as câmaras de vigilância do edifício registam a saída de seis carros com matrícula diplomática, com 15 passageiros a bordo, seguidos de uma carrinha de vidros escuros. 
Ninguém sabe para onde foram nem o que transportavam na carrinha.

O jornalista saudita, crítico das ações do príncipe herdeiro Mohammed bin Salman e alvo de pressões na Arábia Saudita que o levaram a exilar-se nos Estados Unidos, ia apenas pedir um papel ao consulado do seu país em Istambul. 
Também de acordo com o Washingon Post — jornal norte-americano com que Khashoggi colaborava –, o jornalista recebeu nos últimos meses várias chamadas de elementos do regime saudita próximos do príncipe herdeiro a oferecer-lhe proteção e até um trabalho caso regressasse à Arábia Saudita. 
Jamal Khashoggi, porém, permanecia cético em relação às promessas do regime e garantiu a vários amigos que o príncipe herdeiro nunca cumpriria um compromisso de não agressão.

As comunicações intercetadas pelos serviços de inteligência dos Estados Unidos apontam ainda para a possibilidade de que o que aconteceu em Istambul foi uma alternativa apressada para um plano inicial que correu mal. 
Segundo os preparativos discutidos pelos sauditas, o objetivo seria capturar Jamal Khashoggi e levá-lo para a Arábia Saudita para ser interrogado — o jornalista terá resistido e as autoridades turcas garantem que Khashoggi foi morto ainda dentro do consulado, apesar de nenhum corpo ter sido encontrado.






















Mohammed bin Salman, o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, terá ordenado uma operação que tinha como alvo Jamal Khashoggi

A informação que as autoridades norte-americanas tinham sobre os planos sauditas para deter Jamal Khashoggi levanta questões sobre se a administração Trump tinha ou não a responsabilidade de avisar o jornalista, residente nos Estados Unidos, de que corria perigo. De acordo com uma diretiva aprovada em 2015, as agências de segurança norte-americanas têm o “dever de avisar” quaisquer pessoas que estejam em perigo de ser raptadas, feridas ou assassinadas, independentemente de serem ou não cidadãos do país. “O dever de avisar aplica-se no caso de intenção de ferir um indivíduo. Capturá-lo, que seria interpretado como uma detenção, não teria despoletado uma obrigação de ‘dever de avisar’. Se algo nas comunicações intercetadas indicava que estava planeada violência, então sim, ele deveria ter sido avisado”, ressalvou um ex-funcionário da inteligência norte-americana ao Washington Post. A confirmar-se o envolvimento de Mohammed bin Salman, a administração Trump fica também com um problema, já que Jared Kushner, genro e membro do executivo, é muito próximo do príncipe herdeiro da Arábia Saudita.

Entretanto, começam a surgir notícias sobre as identidades dos 15 homens que aparecem nas imagens captadas pelas câmaras de vigilância. De acordo com a Al Jazeera, integram o grupo o diretor da unidade forense das forças de defesa da Arábia Saudita, o antigo diretor dos serviços de inteligência da embaixada saudita em Londres e vários elementos das forças especiais do país.

Há gravações que mostram que jornalista saudita foi torturado e desmembrado no consulado em Istambul

ARÁBIA SAUDITA
Edgar Caetano
12/10/2018, 8:08

"Washington Post" avança que autoridades turcas informaram os EUA de que existem gravações – imagem e som – que mostram que Jamal Khashoggi foi torturado e o seu corpo desmembrado.

O jornalista saudita Jamal Khashoggi terá sido capturado, torturado e morto — com o seu corpo desmembrado — nas instalações do consulado saudita em Istambul, na Turquia. Existem gravações de imagem e som que provam que foi isso que aconteceu ao jornalista e a existência dessas gravações já foi comunicada aos EUA por responsáveis do governo turco, segundo avançou o The Washington Post na noite de quinta-feira.

“A gravação de voz registada no interior da embaixada mostra o que aconteceu a Jamal depois de ele ter entrado”, disse ao jornal norte-americano uma fonte próxima do processo que falou sob anonimato. 
“Consegue-se ouvir a voz de Khashoggi e vozes de homens a falar árabe. Consegue-se ouvir como ele foi interrogado, torturado e, depois, assassinado”, acrescenta a mesma fonte. 
O jornal acrescenta que uma segunda fonte adianta que se ouve claramente o jornalista a ser espancado.

Oficialmente, o governo turco tem receio de divulgar as gravações porque isso mostraria como as autoridades turcas têm o hábito de vigiar as atividades de estrangeiros no país, com recurso a gravações de imagem e som. 
Mas essas gravações existem, segundo as fontes ouvidas pelo jornal norte-americano, e não deixam dúvidas de que o jornalista foi morto e o seu corpo terá sido desmembrado e transportado para fora do consulado nas malas trazidas pela equipa de segurança de 15 pessoas, vinda da Arábia Saudita, que aterrou em Istambul no dia em que o jornalista entrou no consulado para tratar de questões burocráticas com vista ao seu casamento, que aconteceria em breve.

O mesmo jornal norte-americano, para o qual Khashoggi chegou a escrever artigos de opinião, muito críticos do regime saudita, noticiou na quinta-feira que terá sido o próprio Mohammed bin Salman, o príncipe herdeiro da Arábia Saudita e amigo do genro de Donald Trump (Jared Kushner), a ordenar uma operação com o objetivo de atrair o jornalista e detê-lo. 
Os serviços de inteligência dos Estados Unidos intercetaram comunicações entre cidadãos sauditas enquanto estes discutiam o plano.

O regime saudita rejeita quaisquer responsabilidades, garantindo que o jornalista saiu do consulado poucos minutos depois de ter entrado.

No mesmo dia que Khashoggi entrou no consultado, 15 elementos dos serviços secretos sauditas aterraram na Turquia em dois jatos privados, com hotel marcado para quatro noites — mas voltaram a sair do país no mesmo dia. 
Ninguém sabe o que foram lá fazer e, duas horas e meia depois de o jornalista ter entrado no consulado, as câmaras de vigilância do edifício registam a saída de seis carros com matrícula diplomática, com 15 passageiros a bordo, seguidos de uma carrinha de vidros escuros. 
Ninguém sabe para onde foram nem o que transportavam na carrinha.

As comunicações intercetadas pelos serviços de inteligência dos Estados Unidos apontam para a possibilidade de o que aconteceu em Istambul ter sido uma alternativa apressada para um plano inicial que correu mal. 
Segundo os preparativos discutidos pelos sauditas, o objetivo seria capturar Jamal Khashoggi e levá-lo para a Arábia Saudita para ser interrogado — o jornalista terá resistido e as autoridades turcas garantem que Khashoggi terá sido morto ainda dentro do consulado.

Jamal Khashoggi morreu durante troca de murros, diz Arábia Saudita

LIBERDADE DE EXPRESSÃO
Manuel Pestana Machado
19/10/2018, 23:58
Khashoggi desapareceu a 2 de outubro

A imprensa estatal da Arábia Saudita afirma que Jamal Khashoggi morreu na sequência de troca de murros com homens com quem se ia encontrar no consulado. 18 sauditas terão sido detidos.

Jamal Khashoggi, o jornalista que entrou no consulado da Arábia Saudita em Istambul, Turquia, há duas semanas — e não voltou a sair — terá morrido no decorrer de uma troca de murros, noticiou a imprensa estatak saudita, citada pelo The New York Times. 
A imprensa da Arábia Saudita também diz que 18 sauditas foram presos e estão a ser investigados por alegado envolvimento no caso.

O procurador do reino, numa declaração, afirma que Khashoggi se envolveu numa discussão com os homens com quem se encontrou no edifício diplomático, que resultou numa troca de murros. 
Terá sido essa luta que levou à morte do jornalista. 
A afirmação da Arábia Saudita vai contra as declarações de responsáveis turcos, que afirmam que Khashoggi foi morto e desmembrado no consulado, num assassinato premeditado.

Gravações de câmaras de vigilância mostraram vários veículos a saírem do edifício consulado a 2 de outubro. 
Esse foi o dia em que Jamal Khashoggi, um opositor ao regime do reino, entrou no local para tratar dos documentos necessários para casar com a noiva, de nacionalidade turca, que ficou à sua espera fora do edifício. 
Foi divulgado pelo Washigton Post, onde Khashoggi escrevia, que há gravações onde se ouve o jornalista a ser torturado e morto.

A Arábia Saudita tem negado envolvimento desde que a história foi divulgada pelo Washigton Post. 
As autoridades turcas investigaram também o consulado. 
Recep Tayyip Erdogan, presidente da Turquia, avançou esta terça-feira que a polícia estava à procura de materiais “tóxicos e apagados com tinta”, porque algumas áreas do consulado saudita de onde Khashoggi desapareceu foram pintadas de fresco.



Turquia promete “revelar tudo” sobre a morte do jornalista Jamal Khashoggi

LIBERDADE DE IMPRENSA
Agência Lusa
20/10/2018, 13:54

















A versão saudita sobre a morte de do jornalista Jamal Khashoggi contrasta com a dos media turcos e norte-americanos que falam numa execução brutal

A Turquia vai fazer uma investigação independente. Numan Kurtulmus, do Partido Justiça e Desenvolvimento, diz que "não é possível à administração saudita ficar de fora deste crime, caso se confirme".

A Turquia vai revelar tudo sobre a morte do jornalista saudita Jamal Khashoggi, que Riade já reconheceu ter morrido no consulado da Arábia Saudita em Istambul, afirmou este sábado um porta-voz do partido Justiça e Desenvolvimento (AKP), no poder.

“A Turquia vai revelar tudo o que se passou. Ninguém deverá ter a mínima dúvida sobre este ponto”, declarou Omer Celik citado pela agência de informação estatal Anadolu.

“Estamos a realizar a nossa investigação independente. Revelaremos as nossas conclusões. Esta é a vontade do Presidente”, afirmou ainda Celik, segundo o diário Hürriyet.

Estes comentários surgiram horas depois de a Arábia Saudita confirmar que Khashoggi morreu após uma luta no consulado do país em Istambul, Turquia, e que 18 suspeitos foram detidos.

“Não culpamos ninguém antecipadamente, mas não estamos dispostos a manter nada encoberto. É um acontecimento muito grave”, afirmou.

Entretanto, Numan Kurtulmus, também do AKP, disse este sábado que a Turquia irá mostrar as provas que recolher sobre a morte de Khashoggi’s ao mundo e que o “resultado conclusivo” da investigação está perto.

Kurtulmus considerou que “não é possível à administração saudita ficar de fora deste crime, caso se confirme”.

Inicialmente, Riade tinha afirmado que o jornalista tinha saído com vida do consulado, mas este sábado admitiu que Khashoggi morreu após uma luta com pessoas que se encontraram com ele no interior do consulado.

A versão saudita contrasta com a dos media turcos e norte-americanos, baseadas em alegadas provas recolhidas por Ancara, que apontam para uma execução brutal e planeada por um comando de agentes sauditas próximos do príncipe herdeiro, Mohamed bin Salman.

As autoridades turcas não confirmaram até agora as informações da imprensa.

Jamal Khashoggi, o jornalista que desapareceu sem deixar rasto: “O príncipe saudita quer pessoas como eu fora do seu caminho” /premium

ARÁBIA SAUDITA
Cátia Bruno
10 Outubro 2018














Há menos de um ano, o jornalista saudita crítico do regime partilhava os seus receios em entrevista ao Observador. 
Há uma semana, desapareceu depois de entrar no consulado do seu país na Turquia.

Um jornalista saudita entra num consulado do seu país em Istambul e nunca mais ninguém sabe do seu paradeiro. 
As autoridades do consulado dizem que voltou a sair. 
A noiva, que estava à porta, garante que não. 
Onde está? 
Ninguém consegue responder. 
No mesmo dia, 15 elementos dos serviços secretos sauditas aterram na Turquia em dois jatos privados. 
Têm hotel marcado para três noites, mas voltam a sair do país no mesmo dia. 
O que foram lá fazer? 
Ninguém sabe. 
Mais um dado: duas horas e meia depois de o jornalista ter entrado no consultado, as câmaras de vigilância do edifício registam a saída de seis carros com matrícula diplomática, com 15 passageiros a bordo, seguidos de uma carrinha de vidros escuros. 
Quem eram e para onde foram? 
E o que transportavam na carrinha? 
A resposta é igual às anteriores.

Esta é a história real em torno do desaparecimento de Jamal Khashoggi. 
Há uma semana, o jornalista saudita, crítico das ações do príncipe herdeiro Mohammad bin Salman (MbS) e alvo de pressões na Arábia Saudita que o levaram a exilar-se nos Estados Unidos, ia apenas pedir um papel ao consulado do seu país em Istambul — mas o pequeno exercício de burocracia tornou-se num risco que lhe pode ter custado a vida.


















As câmaras de vigilância no exterior do consultado da Arábia Saudita em Istambul registaram o momento da entrada de Jamal Khashoggi, na semana passada. 

As autoridades turcas admitem que possa ter sido morto, talvez até dentro das quatro paredes daquela missão diplomática. 
Riade nega responsabilidades. 
O Washington Post, jornal onde Jamal escrevia regularmente colunas de opinião, publicou uma coluna em branco e promete não descansar até saber o que aconteceu. 
À medida que os dias vão passando, adensam-se as suspeitas de homicídio com motivações políticas por parte do regime saudita.

Que Jamal Khashoggi já tinha tido problemas no passado com as autoridades do seu país, não há dúvidas. 
Isso mesmo contou o próprio ao Observador, numa tarde de outono do ano passado. 
A viver em Washington há apenas um par de meses, estava em Los Angeles de visita quando recebeu um email de uma jornalista de um país distante como Portugal, pedindo-lhe para comentar as mudanças que MbS estava a introduzir no seu país. 
Jamal, jornalista de 59 anos de idade e muitos de experiência, aceitou. 
Estava sempre disponível para falar sobre o seu país.

“A minha mulher preferiu estar segura do que estar a meu lado”
Dias depois, Jamal Khashoggi atendeu a chamada do Observador: “Good morning”, disse a voz do outro lado, num inglês impecável, apenas traído pelo ligeiro carregar do “erre”. 
Jamal aceitou falar sem qualquer limite de tempo, respondendo a todas as perguntas. 
Na conversa, não se limitou à clínica e fria análise política: partilhou a sua história pessoal, incluindo mesmo detalhes da sua vida íntima. 
“Foi muito difícil tomar esta decisão [de vir sozinho para os Estados Unidos]. 
Os meus filhos já são crescidos e têm bons empregos, mas foram proibidos de sair do país. O meu casamento desfez-se devido ao facto de eu ser publicamente crítico do regime. 
A minha mulher preferiu estar segura do que estar a meu lado”, confessou, tomando ele próprio a iniciativa de falar sobre a sua família e o seu divórcio. 
Os seus filhos adultos a viver na Arábia Saudita — confessou Jamal à medida que a conversa se encaminhava para o final, com a voz ligeiramente tremida — tinham medo de partilhar os artigos de opinião do pai nas redes sociais.

A decisão de sair do país, contou, foi tomada depois de receber um telefonema de Saud al-Qahtani, homem próximo da Família Real, por vezes apelidado de “Steve Bannon” saudita. “Foi um telefonema muito educado em que ele me disse que tinha instruções para me proibir de continuar a escrever a minha coluna de opinião”, resumiu o jornalista. 
Jamal já tinha assistido às pressões feitas sobre outros colegas jornalistas, com menos anos de carreira ou estatuto que o seu. 
E até ele próprio já tinha recebido avisos de que não deveria tweetar sobre determinados temas.

O telefonema que ditou o fim da sua coluna no jornal foi a pressão final que o fez temer pela sua liberdade: Jamal fez as malas, despediu-se dos filhos e partiu. 
Chegado aos EUA, não demorou a conseguir um lugar como colunista no Washington Post. O seu primeiro texto não deixou margem para dúvidas sobre o que pensava da situação no seu país: “A Arábia Saudita nem sempre foi assim tão repressiva. Agora é insuportável”, lia-se no título.




















Notícia do desaparecimento levou alguns manifestantes para junto do consulado da Arábia Saudita em Istambul 

O exílio, contudo, não lhe trouxe alívio. 
Para além das saudades dos filhos e do seu país, começou a temer pela sua segurança. “Eles gostariam de me ver fora de cena”, confessou à jornalista da New Yorker Robin Wright, em agosto. 
Antes disso, já tinha tocado ao de leve nessa possibilidade no telefonema que teve com o Observador, embora não entrando em pormenores: “O príncipe é cheio de auto-confiança, mas não quer ter nenhuma oposição, não quer ouvir nenhuma opinião que lhe seja desfavorável. Acha que pessoas como eu podemos distorcer a sua mensagem — e, por isso, quer-nos fora do seu caminho”, sentenciou. 
Antes disso, tinha comparado o que está a acontecer em Riade a uma série de televisão sobre uma corte sangrenta do passado, numa frase que deu o mote ao texto final: “Conhece ‘Os Tudors’?”, perguntou casualmente. 
“O que está a acontecer na Arábia Saudita é como ver ‘Os Tudors’ em fast-forward. É ver as coisas a acontecerem da noite para o dia, estar tudo a mudar e de uma forma sem precedentes.”

Foi uma das várias críticas que estava habituado a fazer ao regime de MbS, denunciando a “vaga de detenções” no país e as tentativas de “humilhação pública” a intelectuais e líderes religiosos que discordem do príncipe herdeiro. 
Mas Jamal também sabia ser equilibrado: foram várias as situações em que reconheceu mérito à nova liderança saudita, como no caso da autorização para as mulheres conduzirem ou na reabertura dos cinemas. 
“Não sou um extremista”, declarou numa entrevista à Economist. 
“Acredito no sistema — quero apenas um sistema com reformas. Quero que o sistema me deixe ter voz e me autorize a falar”, declarou.  
Jamal não se via a si mesmo como um exilado político, garante a editora do Washington Post Karen Attiah: “A missão dele era muito clara: ele só queria poder escrever e ser um jornalista”.

De dissuasor de Bin Laden no Afeganistão a jornalista rebelde no Bahrain
Jamal Khashoggi nasceu na cidade saudita de Medina, em 1958. 
Filho de um comerciante de têxteis, estudou jornalismo nos Estados Unidos, licenciando-se pela Universidade do Indiana. 
Começou a carreira no jornal saudita de língua inglesa Saudi Gazette e no final dos anos 80 trabalhava já para o influente Asharq Al-Awsat, jornal saudita baseado em Londres. 
O seu trabalho na década de 90 daria nas vistas, cobrindo países como o Afeganistão e o Kuwait.

Durante esse período, entrevistou várias vezes Osama bin Laden, à altura guerrilheiro nas montanhas afegãs. 
O jornalista do Washington Post David Ignatius esclarece que Khashoggi chegou a criar laços de amizade com Bin Laden, tendo tentado demovê-lo de perseguir a via da violência para defender o Islão. 
“Não conseguiu”, escreve Ignatius
“Mas ele nunca evitou reconhecer o mal que a Al-Qaeda trouxe à Arábia Saudita e ao mundo. Escreveu uma coluna para o Daily Star, em Beirute, a 10 de setembro de 2002, com o título ‘Um mea culpa saudita’Numa altura em que muitos sauditas estavam a tentar arranjar desculpas para os atentados da Al-Qaeda, Khashoggi descreveu o 11 de setembro como um ataque aos ‘valores da tolerância e da coexistência’ e ao próprio Islão.”

Embora seja um antigo membro da Irmandade Muçulmana, Khashoggi sempre foi próximo da Família Real saudita. 
Trabalhou como conselheiro do príncipe Turki bin Gaisal — ex-diretor dos serviços secretos sauditas e embaixador nos Estados Unidos entre 2005 e 2006. 
Mas isso não o impediu de tentar sempre manter a independência jornalística, o que chegou a trazer-lhe alguns dissabores ainda antes do seu exílio. 
Em 2003, já tinha sido despedido do cargo de diretor do jornal Al-Watan — dizem alguns por existir desconforto com a sua “política editorial”. 
Em 2007, voltou a ocupar o cargo, sendo novamente despedido três anos depois. 
Foi então escolhido para diretor do canal de televisão Al Arab, sediado no Bahrain. 
Em 2015, o canal foi encerrado: oficialmente, citaram “razões técnicas e administrativas”, mas a decisão pode não ter sido alheia ao facto de Khashoggi ter autorizado uma entrevista a um membro da oposição política política no Bahrain.


















Jamal Khashoggi foi visto pela última vez a entrar neste edifício, do consulado saudita em Istambul, na Turquia 

Em 2017, já com MbS a pôr em marcha a sua transformação da sociedade saudita, chegou o telefonema que ditou o exílio de Jamal. 
Um ano depois, o jornalista parecia ter conseguido reconstruir parte da sua vida: tinha comprado uma nova casa e estava de casamento marcado com uma mulher turca, Hatice Cengiz, mestranda em estudos políticos do Golfo Pérsico. 
Foi precisamente por causa desse casamento que Khashoggi se dirigiu, na passada terça-feira, ao consulado saudita em Istambul: o jornalista ia apenas pedir uma certidão de divórcio da sua ex-mulher — aquela que tinha recusado acompanhá-lo para os EUA –, ditando assim o fim do seu casamento.

Homicídio em Istambul ou voo fantasma para uma prisão de Riade?
A visita ao consulado era, por isso, de rotina. 
Uma das pessoas com quem almoçou nesse dia, Azzam Tamimi, recordou ao New York Times como o jornalista tentou reconfortar os amigos, que temiam que Jamal sofresse represálias ao entrar no consulado pelas suas posições críticas de MbS. 
Os funcionários do consulado, disse o jornalista nesse almoço, “são sauditas normais e os sauditas normais são boas pessoas”.

Jamal foi depois com Hatice até ao edifício do consulado. 
À porta, deixou o seu telemóvel com a noiva, já que é proibido entrar com o aparelho no consulado. 
Mas, por precaução, deixou um aviso a Hatice: caso não regressasse, ela deveria contactar um conselheiro do Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan. 
Foi isso mesmo que acabou por acontecer 11 horas depois, quando a noiva deu o alarme.

No domingo, as autoridades turcas reagiram oficialmente ao alerta. 
Primeiro, um conselheiro do Presidente declarou à agência Reuters que acredita que Khashoggi foi assassinado no consulado. 
Depois, o Presidente turco confirmou publicamente que o caso está a ser investigado: “As entradas e saídas da embaixada, as movimentações no aeroporto e os registos de câmaras de segurança estão a ser analisados. Queremos ter resultados rápidos”.

Três fontes (dois turcos e um responsável de um Governo árabe) declararam ao New York Times que a tese de que Khashoggi terá sido assassinado no consulado é a que tem mais força. 
Turan Kislakci, líder da Associação de Media Turco-Árabe, foi ainda mais longe: “Eles confirmaram duas coisas: que ele foi morto e que o seu corpo foi desmembrado”, declarou. 
A noiva de Jamal fez um post no Twitter, onde disse não conseguir crer nessas notícias: “O Jamal não está morto. Não consigo acreditar que ele foi morto”, escreveu.

Na sexta-feira, ainda antes de as autoridades turcas abordarem a possibilidade de homicídio, o próprio príncipe MbS comentou o caso, numa entrevista à Bloomberg, declarando que Khashoggi terá saído do consulado menos de uma hora depois de ter entrado. 
“Ele é um cidadão saudita e estamos muito interessados em saber o que lhe aconteceu”, disse, rejeitando responsabilidades no desaparecimento e garantindo total abertura para que o consulado seja alvo de buscas por parte das autoridades turcas. 
“Não temos nada a esconder”, acrescentou, desafiador.

Uma outra hipótese, contudo, é a de que Jamal não tenha sido morto — nem o seu corpo desmembrado — dentro do consulado saudita. 
“Os sauditas insistem que ele recebeu os seus documentos e saiu, disponibilizando-se para que o consulado seja alvo de buscas; os responsáveis turcos dizem que não o viram sair”, resume o New York Times. 
“Há uma hipótese arrepiante que é a de ambos estarem certos e que o senhor Khashoggi tenha sido levado num veículo diplomático para se juntar a outros críticos do príncipe Mohammed que têm sido presos sem serem sujeitos ao processo criminal devido.” 
Ou seja, há ainda a possibilidade de o jornalista ter sido levado para Riade — podendo estar neste momento detido, tal como aconteceu às ativistas Samar Badawi e Nassima al-Sadah em agosto.

Esta nova tese ganhou mais força com os dados publicados dias depois pelo jornal turco Sabah e citados internacionalmente pelo New York Times. 
De acordo com o jornal, dois jatos privados que transportavam 15 elementos dos serviços secretos sauditas aterraram em Istambul no dia em que Khashoggi entrou no consulado — um antes de ele ter entrado, o outro mais tarde. 
Os passageiros do primeiro voo ter-se-ão instalado num hotel perto do consulado saudita; os do segundo terão ido ter diretamente ao edifício do consulado. 
Ambos os grupos partiram da Turquia no próprio dia.


















Hatice Cengiz (à esquerda), noiva de Jamal Kashoggi e última pessoa a vê-lo antes do desaparecimento

A somar-se a estes dados, há ainda a informação de que os funcionários turcos do consulado tiveram dispensa do trabalho nesse dia, de forma inesperada. 
E juntam-se a tudo isto os registos das câmaras de segurança, que estão a ser analisados pelas autoridades turcas e que, segundo o The Guardian, terão desaparecido do consulado de Istambul. 
Neles, é possível ver um grupo de seis veículos a abandonar o consulado cerca de duas horas e meia depois de o jornalista ter entrado no edifício — segundo o Sabah, os 15 agentes iriam nesses carros. 
Para além deles, saíram ainda uma carrinha negra de vidros fumados e um outro carro, que se dirigiram para a residência oficial do cônsul saudita, onde ficaram durante quatro horas. 
A equipa de investigadores, diz o jornal, acredita que Khashoggi poderia ir dentro da carrinha escura. 

De uma forma ou de outra, acumulam-se as denúncias dos que alertam para uma possível detenção ou assassínio com motivações políticas, numa tentativa do regime de MbS silenciar um dos seus críticos mais destacados. 
“O caso produz uma onda de choque entre os defensores dos direitos humanos e dissidentes da Arábia Saudita em todo o lado, com a erosão de qualquer ideia de que é possível procurar um porto seguro fora do país”, declarou a Amnistia Internacional, definindo este possível assassínio político como “um terrível novo ponto baixo”.

Como se não fosse suficientemente preocupante, o caso pode ainda ter repercussões internacionais, agravando ainda mais as relações diplomáticas entre a Turquia e a Arábia Saudita. 
Como resumiu o jornalista da BBC em Istambul, Mark Lowen, a relação já tem estado tensa por vários motivos, “incluindo o apoio da Turquia ao Qatar no caso do bloqueio feito pela Arábia Saudita; a sua proximidade à Irmandade Muçulmana — que está na lista negra de Riade, considerada uma organização terrorista; e a sua reaproximação ao arqui-inimigo da Arábua Saudita, o Irão”. 
“Mas se for dado como provado, o homicídio de Jamal Khashoggi seria a crise diplomática mais séria entre os dois países de que há memória”, escreve o correspondente.

Também nos EUA, vários responsáveis, incluindo o próprio Presidente, revelaram preocupação com o caso. “Neste momento, ninguém sabe nada sobre isto. Há umas histórias muito más a circular por aí, não gosto disto”, disse Donald Trump. Irá Jamal ser suficiente para Washington entrar na discussão e exigir explicações a Riade — com quem, no ano passado, fechou negócios de armamento no valor de mais de mil milhões de dólares?

A pressão sobre Washington acentua-se cada vez mais à medida que o tempo passa. 
Esta terça-feira, a noiva de Jamal escreveu um artigo de opinião, publicado no Washington Post, onde faz um apelo direto ao Presidente norte-americano: “Imploro ao Presidente Trump e à primeira-dama Melania Trump para que ajudem a explicar o desaparecimento do Jamal”, escreveu. 
No mesmo jornal foi publicada exatamente no mesmo dia uma notícia que dava conta de que talvez a Casa Branca não tenha sido tão apanhada de surpresa como o Presidente deu a entender: segundo uma fonte, antes do desaparecimento de Khashoggi os serviços secretos norte-americanos terão intercetado comunicações de responsáveis sauditas onde era discutido um plano para capturar o jornalista. 
O objetivo seria o de conseguir atrair o jornalista de volta à Arábia Saudita e, aí, “pôr-lhe as mãos em cima”.

Jamal estudou nos Estados Unidos e estava a viver no país desde o verão de 2017 (D.R.)

“Nós, sauditas, merecemos melhor”
Jamal Khashoggi costuma definir-se não como ativista, mas sim como jornalista. 
No entanto, tinha consciência do caráter político da decisão que tomou ao sair do país em protesto. 
Não foi a primeira vez que viu abusos no seu próprio país que o preocuparam: no passado, reconheceu, ficou muitas vezes calado, por medo. 
“Fiz uma escolha diferente desta vez. Deixei a minha casa, a minha família e o meu trabalho e estou a levantar a minha voz”, escreveu na sua primeira coluna no Post. “Quero que saibam que a Arábia Saudita nem sempre foi como é agora. Nós, sauditas, merecemos melhor.”

Isso mesmo disse Jamal ao Observador, naquela manhã de outuno em que estava em Los Angeles a conversar por telefone com uma jornalista portuguesa, do outro lado do mundo. “Se calhar, eu sou só um velho sem importância. Espero mesmo que ele [MbS] seja bem sucedido, mas acho que sozinho vai acabar por falhar”, lamentou-se, depois de ter partilhado a “sensação” de desconforto com que por vezes acordava. 
Mas não quis entrar em pormenores e recusou sempre lamentar-se. 
“Não quero parecer um tipo da oposição zangado”, confessou.

A sua preocupação, explicou, estava apenas com os seus compatriotas: “Eu acredito no sistema, acredito no papel da Casa de Saud [família real]. Só gostava que eu e os outros sauditas pudéssemos participar. Andam a ser tomadas decisões importantes sem ouvir ninguém e acho que isso não é justo”, disse, talvez numa tentativa de simplificar as suas preocupações profundas para uma audiência estrangeira.

“Não é justo”, repetiu o jornalista uma última vez, deixando a frase perdurar do outro lado da linha antes de se despedir, agradecer e desligar.