domingo, 30 de setembro de 2018

Banco de Portugal dá mais tempo ao Montepio

BANCA
Pedro Lima e Sónia M. Lourenço   29 de Setembro de 2018

Está difícil encontrar um presidente do conselho de administração para o banco. Por isso, Carlos Tavares mantém o cargo

O Montepio vai continuar a ter o mesmo presidente do conselho de administração e executivo por mais algum tempo. 
O Banco de Portugal (BdP) acedeu ao pedido para prolongar o período desta solução transitória, permitindo que Carlos Tavares continue a acumular os dois cargos. 
O gestor já tinha sido confirmado, em 20 de julho, como presidente executivo, mas falta agora cumprir a determinação de ter outra pessoa a liderar o conselho de administração (não executivo).

O pedido de prolongamento foi feito pela associação mutualista — detentora de praticamente 100% do capital do banco. 
E a expectativa do BdP, ao aceitar o prolongamento do prazo, é que em muito pouco tempo se encontre uma solução — nomeadamente até 7 de dezembro, data das eleições para a associação mutualista. 
Será um período inferior aos seis meses concedidos inicialmente. 
O BdP recusa fazer comentários sobre o assunto, nomeadamente quanto ao prazo que foi dado para se chegar a uma solução.
Mas o “Jornal Económico” avançava ontem que é por mais quatro meses.

TOMÁS CORREIA AINDA NÃO DECIDIU
Só que encontrar um nome que gere consensos não está a ser tarefa fácil. 
A associação mutualista está bastante dividida a pouco tempo das eleições para a sua presidência. 
De um lado está António Tomás Correia, presidente da associação, e do outro estão os seus críticos —incluindo Fernando Ribeiro Mendes, administrador da associação mutualista e que já se declarou como candidato à presidência — que não se têm coibido de criticar publicamente Tomás Correia e lançaram inclusivamente um manifesto que diz pugnar por “candidatos idóneos” nas eleições de 7 de dezembro. 
O Conselho Geral não chegou a entender-se quanto ao nome inicialmente apontado para o cargo — Álvaro Nascimento, professor universitário e ex-presidente da Caixa Geral de Depósitos (CGD). 
Por isso, o nome não foi formalmente comunicado ao BdP, apenas tendo havido uma consulta prévia — uma forma de testar o nome — de forma a perceber se havia alguma oposição.

Ao Expresso, Tomás Correia disse que ainda não decidiu se se candidata a mais um mandato. 
A decisão será tomada durante o mês de outubro, sendo que o prazo para apresentar candidaturas termina no dia 31 desse mês. 
Em aberto está a possibilidade também de patrocinar uma candidatura.
DIVISÕES NA ASSOCIAÇÃO MUTUALISTA CONDICIONAM NOMEAÇÃO DE PRESIDENTE DA ADMINISTRAÇÃO
O presidente da associação mutualista considera que, apesar de ter sido acusado pelo BdP de irregularidades graves quando era presidente do Montepio, isso não o impede de se candidatar a mais um mandato, porque o novo Código das Associações Mutualistas só entra em vigor no próximo ano. 
Quer Tomás Correia quer os outros oito ex-gestores acusados apresentaram já a sua defesa, pelo que o BdP, que está agora a analisar os elementos entregues, decidirá então se avança para uma acusação ou se os iliba. 
No caso de haver acusação, poderá ainda haver recurso.

Tomás Correia está também a ser acusado, por membros do Conselho Geral da associação mutualista, de ter ‘sonegado’ informação financeira relativa ao primeiro semestre. Segundo o “Público”, queixam-se de que houve uma “alteração do modelo informativo habitual”, que “sonegou o acesso aos números do balanço e da demonstração de resultados”. 
Algo a que Tomás Correia, em declarações ao Expresso, diz ser “mais do mesmo, faz parte da campanha eleitoral”.

BANCO MELHORA RESULTADOS
Enquanto a Associação Mutualista procura o seu rumo, o banco continua a tentar recuperar a sua atividade. 
Com os lucros a subirem na primeira metade do ano — atingiram €15,8 milhões, aumentando 21,1% em termos homólogos —, Carlos Tavares considerou que “é um resultado ainda modesto, mas positivo”. 
Para esta evolução contribuíram o aumento de 3,9% nas comissões líquidas (para €57,4 milhões), bem como a redução dos custos operacio­nais em €4,5 milhões. 
O resultado contou também com a ajuda da redução de 33,2% das imparidades (nomeadamente de crédito), para os €59,5 milhões. 
Em sentido contrário, a margem financeira diminuiu, fruto, entre outros fatores, de alguma redução do montante de crédito.

O banco prepara-se agora para atacar uma nova fase. 
O plano de transformação preparado pela equipa de Carlos Tavares é de “profunda mudança”, disse aos jornalistas. 
E passará por trabalhar “nos segmentos da população menos beneficiados por serviços bancários”
Lembrando que, “fruto da reestruturação da banca, muitas áreas ficaram sem relação de proximidade” com a banca, Carlos Tavares anunciou que o Montepio vai abrir 10 balcões até ao fim do ano, no âmbito de um projeto de “abertura de pequenos balcões de proximidade, com custos controlados, em zonas com potencial e que podem ser diferentes das tradicionais”.

Carlos Tavares disse também que a Caixa Económica Montepio Geral vai mudar de marca comercial ainda este ano. 
O nome nos balcões vai mudar — sendo certo que a designação Montepio se manterá — mas o banco vai manter-se juridicamente como Caixa Económica. 
Também o Montepio Investimento mudará de nome e vai tornar-se banco de empresas. 

Efeito cambial trama construtoras

ANGOLA
Economia
Abílio Ferreira   29 de Setembro de 2018
António Costa e João Lourenço voltam a encontrar-se no fim de Novembro em Lisboa

Dívida em euros cai para menos de metade por causa da desvalorização do kwanza

No rescaldo da operação diplomática do primeiro-ministro, António Costa, em Luanda, há uma boa e uma má notícia para as empresas, em especial da fileira da construção, credoras do Estado angolano. 
A boa é que Angola reconhece a dívida e compromete-se a pagá-la. 
A má é que não assume a atualização cambial, reduzindo para menos de metade a fatura em euros. 
Na prática, é um perdão forçado que rondará os €300 milhões.

“Ainda bem que há dinheiro, é uma pena que não venha o dinheiro todo”, desabafa ao Expresso um industrial. 
Os agentes empresariais confiam que uma “pressão política adicional do Governo português ajude a acelerar o pagamento”, cujo programa deve ser apresentado por Luanda aquando da visita do Presidente João Lourenço a Lisboa, marcada para 23 e 24 de novembro. 
Nessa altura, já a Cosec terá acertado a extensão em €500 milhões de linha do Estado português para cobrir negócios com Angola e que volta a incluir uma fração destinada a liquidar dívidas atrasadas.

O reforço para €1500 milhões “terá expressão no Orçamento de 2019”
Como se trata de uma extensão “as regras e condições de acesso mantêm-se: apoiar as empresas portuguesas na execução de projetos contratados com Angola”, responde ao Expresso o Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE).

NOVO FÔLEGO
A linha é um novo fôlego para as construtoras que ganham margem financeira para se aventurarem por novas obras públicas. 
Como diz um empreiteiro radicado em Luanda, “as dívidas dos Estados são para rolar a gerir”
O incómodo surge quando os pagamentos cessam e a circulação é interrompida. 
A linha reativa o circuito. 
Tal percalço não afetou os exportadores de ramos prioritários, como alimentar ou farmacêutico, que fornecem o universo estatal.

A estimativa do Governo angolano aponta para uma dívida global de 100 mil milhões de kwanzas (€290 milhões ao câmbio atual). 
Mas, o processo está ainda em fase de escrutínio e certificação, empresa a empresa. 
Só os contratos que forem validados contarão para o apuramento final. 
Todos os agentes relevam o facto de o valor ter sido anunciado na moeda angolana.

Após o ciclo depressivo 2012/2015, o número redondo que circulava no sector da construção para dimensionar a dívida acumulada era de 1000 milhões de dólares (€850 milhões). 
Mas a cifra sofreu uma redução acentuada pelo recurso do Estado a títulos de dívida pública (sem risco cambial) para saldar pagamentos. 
Desde então o kwanza perdeu 70% do valor face ao euro.

Nem a CIP — Confederação Empresarial de Portugal nem as associações sectoriais dispõem de dados atualizados. 
A AECOPS — Associação de Empresas de Construção Obras Públicas e Serviços situa a dívida entre os €400 e os €500 milhões, mas não tem um valor apurado. 
Uma parte “está em aprovação e a restante tem um valor por apurar por estar denominada em moeda local”, diz Ricardo Pedrosa Gomes, presidente da AECOPS.

Os valores indicados “pecam por defeito”, reage Reis Campos, presidente da Confederação Portuguesa da Construção e Imobiliário (CPCI). 
Mas o industrial descarta a querela dos números e prefere valorizar “o sinal positivo que decorre da intenção de pagar”. 
Qualquer solução “é sempre melhor do que nada”. 
As construtoras “reconhecem o esforço de Angola” e percebem que o problema “tem de ser resolvido de modo gradual”.

PAGA TARDE, MAS SEMPRE
Quando o tema é a dívida do Estado angolano, António Mota, o patrão da Mota-Engil repete o lema, cimentado numa carreira de 70 anos no país. “Angola paga tarde, mas paga sempre.” 
Ricardo Pedrosa Gomes subscreve. “O histórico do relacionamento confirma essa afirmação.” 
Outros industriais invocam a “cultura africana” para balizar o caso angolano, advertindo que uma estratégia coerente de internacionalização exige sempre “músculo financeiro adequado” para resistir às adversidades.

O primeiro expediente a que Angola recorreu para regularizar os atrasados foi a entrega de títulos soberanos para abater à dívida. 
A solução tornou-se um mal menor e a generalidade dos credores aceitou as obrigações do Estado que servem de cobertura a empréstimos bancários. 
Por exemplo, no acerto de contas pela requalificação da Baía de Luanda, a Mota-Engil recebeu €70 milhões em títulos de dívida. 
Em três anos, a exposição da construtora evoluiu de €28,7 milhões (2015) para €165 milhões (2017). 
A Teixeira Duarte investiu o equivalente a €40 milhões, transformando, em 2017, um terço em liquidez. 
Outras construtoras, como a Manuel Couto Alves (MCA) de Guimarães, de reduzida expressão em Portugal, rivalizam com os gigantes nacionais na obra pública angolana e acumulam igualmente um valor elevado de obrigações.

Reis Campos nota que agenda luso-angolana não se esgota no caso das dívidas e aponta o intercâmbio de trabalhadores como um dos aspetos centrais. “Nós temos formação profissional, eles têm gente disponível”, diz o industrial. 
Uma solução perfeita para resolver o défice de mão de obra que a CPCI calcula em 70 mil.

João Luís Traça, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portugal-Angola, realça que os sinais recentes “confirmam a vontade de o Governo de Luanda de resolver todos os atritos e aprofundar a cooperação com Portugal”. E os empresários portugueses não podem subestimar esta realidade: “Angola é dos raros mercados em que ser português é uma vantagem competitiva.” 

sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Joana Marques Vidal. Os sucessos e os falhanços da PGR /premium


JOANA MARQUES VIDAL
Pedro Rainho e Rita Dinis
20 Setembro 2018
















Falta menos de um mês para Marcelo decidir sobre a proposta de António Costa para liderar o Ministério Público e a discussão tornou-se política. 
Mas, raspando a superfície, o que foi o mandato da PGR?

Operação Marquês, Operação Fizz, Vistos Gold, PT/BES, Operação Atlântico, investigações aos “três grandes” do futebol nacional, etc., etc., etc. 
É um curriculum bem composto, o de Joana Marques Vidal. 
Sobretudo, se pensarmos que, em apenas seis anos, desde que tomou posse como Procuradora-geral da República (PGR), o Ministério Público acusou um antigo primeiro-ministro, fez cair um ministro de um Governo PSD, investigou um ministro do Governo de António Costa e levou à saída de vários dos seus secretários de Estado, gelou as relações políticas entre Portugal e Angola com um processo contra um ex-vice-presidente, afastou juízes-desembargadores das suas funções na Relação de Lisboa e muito mais. 
Os poderes abanaram como nunca tinha acontecido antes. 
Mas isso deve-se a uma espécie de one woman show, como parecem sugerir os defensores da recondução, ou esse legado de Marques Vidal é, na verdade, resultado das mudanças que o poder político introduziu na Justiça portuguesa?

O debate em torno da eventual recondução da atual PGR reduziu o tema a um choque entre a ala pro-continuidade — que cola a imagem de Marques Vidal aos resultados (ainda provisórios) do Ministério Público (PM) nestes seis anos — e a ala anti-perpetuação da figura máxima da investigação judicial. 
Por baixo dessa camada superficial está tudo o resto: o perfil da Procuradora-Geral da República, as escolhas que fez para lugares-chave na estrutura do Ministério Público e as mudanças legislativas que espalharam o combate à corrupção pelo país.

Os elogios à passagem da PGR pela liderança do MP são quase unânimes, entre os responsáveis políticos, mas também entre pares. 
Ainda assim, entre dentes, há também quem questione a “hipervalorização” de Marques Vidal e esqueça tudo o resto. 
“A PGR teve muitos méritos, mas tem-se hipervalorizado o papel dela, parece que ela é que investiga e despacha tudo”, aponta um dos procuradores ouvidos pelo Observador.

A ministra da Justiça ouviu os partidos esta quarta-feira sobre quem pensam que deve liderar o Ministério Público, com o PS a assumiu abertamente a lógica de “mandato único” e o líder do PSD a revelar que “não ficaria surpreendido” se Marques Vidal seguisse para mais seis anos de mandato. 
Agora, António Costa toma (ou anuncia) a decisão e a bola passa para o Presidente da República. 
O anúncio, garante a ministra da Justiça, está “para breve”.

1 - Amadeu Guerra: a “melhor escolha” da PGR















A decisão de nomear Amadeu Guerra não foi unânime, apesar de ter reunido um amplo consenso no Conselho Superior do Ministério Público, o órgão a quem cabe a palavra final sobre a direção do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP). 
Em fevereiro de 2013, poucos meses depois de assumir a liderança do Ministério Público, quando indicou o nome do procurador-geral-adjunto para a direção do departamento onde se investigam os processos mais complexos da Justiça portuguesa, Joana Marques Vidal recebeu três votos contra e 16 a favor. 
Mas a escolha daria frutos: “Nomear Amadeu Guerra para a liderança do Departamento Central de Investigação e Ação Penal foi a decisão mais importante que tomou”, considera um procurador da República.

Essa foi a “mola impulsionadora” para as grandes investigações, ilustra um outro procurador. Ligado a alguns dos processos mais mediáticos dos últimos anos, o magistrado explica ao Observador que as “pressões” sobre o poder judicial se vão esbatendo à medida que aumenta a distância em relação aos centros de poder. 
Virando o prisma de análise, percebe-se que, se há unidade no MP onde a pressão se exerce com mais veemência, essa unidade é o DCIAP. 
É ali que se investigam os mais poderosos, é ali a morada dos inquéritos judiciais mais complexos e que mexem com mais interesses no país (e isso não mudou com reorganização do Ministério Público, como vai perceber mais à frente).

Em março de 2013, quando recebeu das mãos de Cândida Vilar a direção daquele departamento, Amadeu Guerra — uma figura que alguns consideram injustamente secundada no atual debate sobre o combate à corrupção em Portugal — começou a arrumar a casa. 
Foi buscar caras novas, não renovou as comissões de serviço da maioria dos elementos que tinham chegado no mandato anterior e começou a acompanhar mais de perto o andamento dos processos que por ali passavam. 
Muito mais de perto.


A Operação Marquês é, aliás, paradigmática, não só porque ilustra a postura de Amadeu Guerra na gestão diária do seu departamento mas também porque também mostra a forma como, durante a sua liderança, o DCIAP se blindou contra as intervenções vindas de fora e ganhou independência — inclusivé, em relação à própria hierarquia do Ministério Público.

As últimas semanas do inquérito da Operação Marquês foram uma verdadeira maratona. 
O extensíssimo despacho de acusação (são 3908 páginas) foi escrito a mais de uma dezena de mãos para concluir a tempo e horas o documento, assinado por sete procuradores, que levaria a uma acusação contra, entre outros arguidos, o antigo primeiro-ministro José Sócrates. 
O nome de Amadeu Guerra não consta dos sete autores do documento, mas o diretor do DCIAP também terá colaborado nessa tarefa.


Antes desse momento derradeiro de um dos mais importantes processos de sempre do MP, por duas vezes o procurador tomou posições de força relativamente a Joana Marques Vidal. A primeira acontece em março de 2017, quando a PGR concede um alargamento do prazo de conclusão do interrogatório mas, pelo caminho, abre a porta ao afastamento de Rosário Teixeira da titularidade do processo, questionando a sua capacidade para liderar o caso. Amadeu resiste e mantém a confiança no procurador.

Os atrasos na conclusão do inquérito voltam a colocar Amadeu Guerra e Joana Marques Vidal em confronto. 
Ainda em março, a PGR dizia “não se justificar qualquer reponderação do prazo estabelecido” para esse objetivo, depois de já ter alargado em seis meses o calendário do DCIAP. 
Mas a decisão, que deveria sair nesse mesmo mês, só seria conhecida em outubro do ano passado. 
“Amadeu Guerra aguentou os timmings do inquérito, mas se tivesse cedido aos pedidos para concluir o despacho mais cedo teriam ficado questões muito relevantes fora do processo”, assegura um procurador com conhecimento do caso.


Agora, num momento em que se discute a saída ou continuidade de Joana Marques Vidal na liderança do MP, Amadeu Guerra é o outro protagonista a meses de terminar o mandato. 
A decisão tem de ser tomada até fevereiro do próximo ano. 
“Uma decisão poderá acarretar a outra, porque, se a PGR sai e o diretor do DCIAP também sai, isso pode fazer mossa na investigação judicial”, diz uma fonte do Ministério Público.


2 - Novo mapa judiciário: um país atrás da corrupção















Ainda assim, se a decisão de indicar o nome de Amadeu Guerra é vista como uma das decisões mais acertadas de Joana Marques Vidal, também há quem defenda que a PGR soube tirar proveito das mudanças que vieram de fora para reforçar o combate à corrupção durante o seu mandato. 
Uma dessas mudanças surgiu com o novo mapa judiciário, ainda pela mão da ministra Paula Teixeira da Cruz, em setembro de 2014.

Com essa reforma, a investigação aos crimes de colarinho branco deixaram de estar centradas no DCIAP e passaram a poder ser conduzidos nos Departamentos de Investigação e Ação Penal do s distritos do Porto, Coimbra, Lisboa e Évora. 
Além disso, mais de duas dezenas de comarcas passaram a ter núcleos de especialização onde os crimes económico-financeiros também passam a ser analisados. 
O “número de especialistas no combate ao crime economico-financeira aumentou exponencialmente”, em vez de estar centrado nos grandes centros urbanos, defende um procurador.

É no “mix” destas duas alterações que se define a maior mudança introduzida no Ministério Público desde 2012. 
Além de reforçar o DCIAP, Marques Vidal “soube reorganizar o resto da estrutura do MP no país, criando secções de especialidades de combate ao crime económico nos DIAP’s distritais”, uma mudança que, antecipa fonte do Conselho Superior da Magistratura, “vai ter resultados a curto-prazo”.


Ao alargar a investigação ao outros departamentos, a PGR aliviou a pressão (e a sobrecarga processual) que recaía sobre o DCIAP, onde acabavam por ir parar todos os processos mais sensíveis ou mais complexos e que, por isso, exigiam uma maior preparação técnica. 
“Hoje, com a complexidade da sociedade em que vivemos, já não pode haver a ideia do clínico de medicina geral” na investigação criminal, diz fonte do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP).


3 - Marques Vidal: uma PGR em cima do MP















Há um terceiro ponto que as várias fontes ouvidas pelo Observador apontam para explicar o que mudou num Ministério Público guiado sob a batuta de Joana Marques Vidal: a proximidade entre a Procuradora-geral da República e toda a estrutura de investigação judicial.

“Seria redutor dizer que as mudanças se devem só” à atual PGR, “mas em grande medida” isso é verdade, defende a mesma fonte do CSMP. 
Rui Cardoso, antigo presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, faz a mesma leitura. 
“De modo algum” seria correto apontar as mudanças no MP como obra de uma pessoa só. O contributo de Marques Vidal para os progressos da investigação judicial “foi essencial, mas os resultados são do trabalho de muitíssimas pessoas, com diferentes responsabilidades”, destaca o magistrado.

A PGR intervenção da PGR notam-se, sobretudo, no seu “empenho” e no “apoio que deu aos magistrados para sempre poderem agir com objetividade e respeito pela lei”, seguindo o princípio de que ela é igual para todos. 
Mas também “por algumas escolhas, nomeadamente para o DCIAP”, ainda que a nomeação caiba sempre ao CSMP, e “pela criação de melhores condições de trabalho”, não só no departamento onde vivem os mega-processos mas também nos departamentos distritais onde as tais mudanças no mapa judiciário, em 2014 tiveram particular impacto.

Além disso, Marques Vidal é uma presença regular junto dos órgãos locais. 
Reúne-se de quinze em quinze dias com os procuradores-gerais distritais e aproveita esses encontros com esses coordenadores para “afinar procedimentos, lançar novas iniciativas, até uniformizar procedimentos” na ação dos procuradores. 
“Está sempre a trabalhar em conjunto com uma máquina que é pesada e as orientações que quinzenalmente são dadas aos coordenadores distritais correm a hierarquia, até ao mais distantes dos procuradores”, diz o mesmo elemento do CSMP.

“Mais do que aproveitar os recursos humanos, Marques Vidal conseguiu mobilizar” a estrutura do MP a seguir um exemplo que veio de cima, destaca a mesma fonte. 
Não sendo conhecida pela sua grande capacidade técnica nem por um domínio aprofundado da legislação, Marques Vidal tem fama de “trabalhar horas e horas a fio, sem dar grandes sinais de cansaço” e pela “capacidade de levar as coisas para a frente, obrigando quem trabalha com ela a seguir o ritmo”. 
Rui Cardoso também destaca as mudanças na “organização” do MP, por exemplo com a aposta em “sistemas de análise de informação” que agilizaram a investigação, sobretudo em processos particularmente complexos e pesados.

Mas, agora, o tempo é o da política. 
Até 12 de outubro, António Costa terá de levar um nome a Marcelo Rebelo de Sousa. 
Só aí se fecha um processo que a ministra da Justiça abriu há nove meses.

Reconduzir ou não reconduzir a Procuradora-Geral da República é uma discussão que há muito ultrapassou o plano da justiça. 
Em janeiro, a ministra da Justiça abriu a porta à saída de Joana Marques Vidal quando o seu mandato de seis anos chegasse ao fim, em outubro, mas as suas declarações só serviram para abrir a porta a uma discussão política que não acalmou desde então. 
A PGR que vai ser lembrada por, pela primeira vez na história, ter aberto uma investigação a um ex-primeiro-ministro, ao maior banqueiro do país, e ao maior clube de futebol nacional não deve ser reconduzida? 
Quem quer ficar com o ónus dessa não-recondução?


A questão é essa: ninguém. 
Nem mesmo quem entende que o espírito da lei aponta para a existência de um mandato único, que foi alargado de 4 para 6 anos precisamente com vista à não-renovação — embora na Constituição isso não tenha ficado expresso. 
O artigo 220º da Constituição da República diz que “o mandato do Procurador-geral da República tem a duração de seis anos, sem prejuízo do disposto na alínea m) do artigo 133.º”, sendo que essa alínea diz que “cabe ao Presidente da República nomear e exonerar, sob proposta do Governo, o presidente do Tribunal de Contas e o Procurador-Geral da República”.

Nas audições desta quarta-feira aos partidos, a ministra da Justiça confirmou aquilo que já se vinha adivinhando nas últimas semanas com as declarações de alguns responsáveis dos principais partidos. 
Mas os encontros não foram um desperdício de tempo, desde logo porque permitiram clarificar aquilo que se ia lendo nas entrelinhas. 
A alguns milhares de quilómetros do Terreiro do Paço, em Salzburbo, Áustria, Rui Rio foi protagonista de um desses momentos de clarificação. 
Aos jornalistas, o líder do PSD disse que “não ficaria surpreendido” se a atual Procuradora-geral da República fosse reconduzida no cargo. 
Não foi muito mais longe mas já deixou perceber que a continuação de Marques Vidal não lhe provoca anticorpos.

À porta do Ministério da Justiça, Carlos César foi outra voz clarificadora. 
“O cargo de Procurador-geral da República ganha independência sendo um mandato prolongado e único” disse o líder parlamentar do PS, sublinhando que “essa orientação e essa doutrina estiveram presentes nos debates que ocorreram aquando da revisão constitucional de 1997”.

Também houve intervenções menos clarificadores. 
O PCP, por exemplo, defendeu no final da audiência com a ministra da Justiça que “é tempo de pôr termo à instabilidade criada pelo PSD e CDS em torno da nomeação da figura da procuradora para os seus objetivos partidários” e até voltou a elogiar os “passos importantes” dados no mandato da atual PGR — mas não desvendou a sua posição final sobre o nome em cima da mesa. 
O Bloco tem falado num “balanço positivo do mandato” de Marques Vidal e Assunção Cristas (CDS) já defendeu a manutenção da responsável máxima do Ministério Público.

Já esta quinta-feira, a ministra disse que estaria "para breve" o anúncio da decisão do Governo. 
“Os partidos foram ouvidos com o objectivo de colhermos a sua sensibilidade nessa matéria, não porque seja uma matéria partidária, nem deve ser partidarizada, mas porque se considerou que, sendo um assunto de interesse nacional, os devíamos ouvir e porque havia uma prática nesse sentido“, admitiu Van Dunem.

Em entrevista à TSF, em janeiro, Francisca Van Dunem pegou no exemplo do ex-procurador-geral Cunha Rodrigues, que esteve 16 anos no cargo (entre 1984 e 2000), para defender o caminho inverso, o da limitação de mandatos. 
“A Constituição prevê um mandato longo e único. 
Historicamente é a ideia subjacente ao mandato”, disse recordando que essa era “a grande questão que se colocava” na altura de Cunha Rodrigues. 
Depois disso, “o que se estabeleceu foi um mandato longo e um mandato único”, disse. 
Mas essa interpretação estava longe de ser consensual. 
Nove meses depois, quando o assunto tem mesmo de ser posto em cima da mesa, vários dirigentes políticos, da esquerda à direita, têm elogiado a atuação de Joana Marques Vidal à frente do Ministério Público e têm dado a entender que são a favor da recondução, embora digam que não querem “partidarizar” a questão.

Certo é que cabe ao Presidente da República nomear a/o PGR, sob proposta do primeiro-ministro, que já fez saber que vai ouvir os partidos com assento parlamentar antes de chegar ao Presidente da República. 
Como o Observador noticiou, a recondução é o desejo de Marcelo e a própria Joana Marques Vidal já lhe transmitiu que aceita ficar.


Mas, curiosamente, não era esse o entendimento do mesmo Marcelo Rebelo de Sousa que, há 20 anos, quando era líder do PSD, esteve por detrás da revisão constitucional de 1997, que estipulou o alargamento de 4 para 6 anos do mandato do PGR. 
Nessa altura, o PS fez questão de deixar em aberto a possibilidade de renovação, enquanto o PSD afirmava simpatizar com a proposta de deixar claro na Constituição que o mandato não seria renovável: PS, CDS e PCP votaram contra a ideia de ficar inscrito na Constituição que o mandato não seria renovável, enquanto o PSD absteve-se.

Segundo recordou o semanário Sol em janeiro, na sua “História Política da Revisão Constitucional de 1997 e do Referendo à Regionalização”, Marcelo Rebelo de Sousa recorda que, naquela altura, não tinha nada contra o procurador-geral de então, Cunha Rodrigues, mas que o que o movia era o princípio de que os mandatos devem ser limitados. “Quanto à limitação do mandato do procurador-geral da República, paralela, de resto, à de todos os demais titulares de órgãos de nomeação política, ela não tinha nem tem nada de pessoal”, lê-se.

Também em 2005, quando o governo aprovava em Conselho de Ministros um limite de 12 anos consecutivos para os mandatos de primeiro-ministro, presidentes dos governos regionais, presidentes de Câmaras e de juntas de freguesia, o então professor Marcelo dizia que a medida da limitação só pecava por ser “curta”. 
“Acho que a limitação é importante, se algum defeito tem é que é curta, deviam ser oito anos e não 12” disse Marcelo Rebelo de Sousa na altura.


Em todo o caso, Marcelo, o Presidente da República, já terá feito saber que é a favor da recondução da magistrada, pelo que dificilmente o desfecho será outro. 
O que é que Joana tem, afinal, que faz com que (quase) todos — mesmo os que defendiam a limitação de mandatos — não consigam defender publicamente a sua não-recondução?


4 - Processos parados, arquivamentos e falta de pessoal: as manchas no currículo da PGR
Há, no entanto, quem questione os resultados deste Ministério Público, na versão Marques Vidal. 
E apontam-se casos concretos: o processo do “terrorista” holandês detido no aeroporto de Lisboa, que não confirmou a acusação; o caso dos submarinos, prescrito; o processo da Tecnoforma, prescrito; e o BPN, uma investigação parada.

Em julho de 2014, Gima Calunga foi detido na placa do aeroporto de Lisboa, junto ao trem de aterragem de um avião da angolana TAAG. 
Tinha uma faca consigo e estaria a preparar um ataque de inspiração terrorista, apesar de sempre ter alegado que fugia de “espíritos” quando se aproximou do avião. 
Um ano mais tarde, o Ministério Público manteve a sua tese, “um lobo solitário” a mando do Daesh e de praticar, entre outros crimes, de terrorismo internacional e de apoio a organizações terroristas.

Mas o angolano, naturalizado holandês, acabaria condenado apenas a um pena de três anos e meio de prisão efetiva por atentado à segurança de transporte aéreo, confirmada pela Relação de Lisboa (que reduziu a pena em um ano). 
O terrorismo caiu na primeira sentença.

O processo dos submarinos ficará como outro marco, pela negativa, do mandato de Marques Vidal. 
A eurodeputada Ana Gomes, que se tinha constituído como assistente, ainda tentou levar a decisão de arquivamento à Relação de Lisboa, depois de o juiz de instrução Carlos Alexandre ter arquivado o caso em 2014. 
O inquérito envolvia suspeitas sobre Paulo Portas e o ex-ministro da Defesa chegou a ser ouvido na reta final, apenas como testemunha. 
Insucesso: a Relação confirmou o arquivamento por falta de factos que validassem a reabertura, dez anos depois da assinatura do contrato com o German Submarine Consortium (GSC).

A lista de crimes do caso Tecnoforma era extensa. 
As suspeitas iam da prática de crimes de corrupção ativa, passiva, abuso de poder e participação económica em negócio a prevaricação, fraude na obtenção de subsídio e desvio de subsídio. 
O processo nasceu, sensivelmente, na reta final do mandato de Cândida Vilar, mas os factos reportavam-se aos anos de 2002 a 2004.

Havia suspeitas de que a empresa, por onde passou o ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, teria beneficiado indevidamente de fundos europeus para realizar ações de formação profissional. 
O ex-ministro Miguel Relvas também surgia envolvido no caso. 
De nada valeram as suspeitas de fraude levantadas pelo Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) — o caso acabou arquivado há um ano.

O ex-ministro do PSD Dias Loureiro e o antigo presidente do BPN José de Oliveira e Costa estavam a ser investigados pelos crimes de burla qualificada, branqueamento e fraude fiscal qualificada. 
O nome do processo: BPN, um dos braços do polvo judicial em que o caso principal se tornou. 
O Ministério Público ainda analisou a “informação bancária relativa às operações e aos sujeitos intervenientes” mas, “não obstante as diligências realizadas, não foi possível reunir prova suficiente, suscetível de ser confirmada em julgamento, da prática dos crimes imputados a estes arguidos” e um cidadão libanês também envolvido no processo”, referia a nota do Ministério Público publicada abril do ano passado.

Em abril, uma notícia do Correio da Manhã referia que o Ministério Público se preparava para fechar a acusação da processo Monte Branco
Foi uma surpresa, uma vez que o processo, nas mãos do procurador Rosário Teixeira (o homem do leme na Operação Marquês), era dado como inanimado há longos meses para que os magistrados pudessem dar prioridade a outros processos. 
A acusação não surgiu e a investigação a uma rede de branqueamento de capitais — num caso que arrastaria vários nomes da praça pública para esse e outros processos, da política (José Sócrates) à banca (Ricardo Salgado) — continua a arrastar-se.

Conclusão: pondo de lado o impacto mediático que alguns dos processos judiciais dos últimos anos tiveram, os resultados podem ter ficado aquém do esperado. 
Seja porque os casos prescrevem, seja porque o Ministério Público acaba por arquivar a matéria mais sensível, seja ainda porque os principais envolvidos são ilibados. 
Os dados do Conselho de Prevenção da Corrupção referentes ao ano passado e divulgados pelo jornal Público, em maio deste ano, revelavam que das 408 comunicações de suspeitas de crimes de corrupção feitas por este organismo junto dos tribunais, 59,8% acabaram arquivadas. 
Houve, nesse período, cinco condenações e dois arguidos foram absolvidos, de acordo com o relatório de balanço que o conselho elaborou.

Nos próximos meses ou anos, há ainda duas provas de fogo para o Ministério Público: as sentenças dos Vistos Gold (aquele caso que afastou Miguel Macedo do Governo) e da Operação Fizz. 
Resolvido o incidente diplomático gerado com a investigação ao antigo vice-presidente angolano Manuel Vicente, resta saber se o tribunal considera que o procurador Orlando Figueira recebeu dinheiro para arquivar processos em que o governante angolano estava envolvido: a leitura da sentença está marcada para dia 8 de outubro.

Quanto a Vicente, cabe às autoridades em Luanda decidir o que fazer, depois de ter sido extraída uma certidão do processo de Lisboa. 
O banqueiro Carlos Silva e o advogado Proença de Carvalho serão investigados em processos autónomos.

Há, ainda, um processo gigante chamado Operação Marquês. 
Para já, é preciso definir quem fica responsável pela instrução do processo: Carlos Alexandre ou Ivo Rosa, os dois super-juízes do Tribunal Central de Instrução Criminal.


Último ponto: a batalha (perdida) de Joana Marques Vidal pelo reforço do Ministério Público. A PGR não pede mais poderes, mas tem lutado ao longo dos anos por um reforço das equipas. 
Precisa, diz, de mais gente para dar resposta à carga que engole os procuradores em processos empilhados até à altura do teto. 
Marques Vidal — a 38ª mais poderosa de Portugal, para o Jornal de Negócios — reclama, mas o poder político assobia para o lado.

Joana Marques Vidal diz que hipótese de recondução nunca lhe foi colocada

PGR
Sónia Simões
21 de Setembro de 2018 ATUALIZADO
A Procuradora-Geral Joana Marques Vidal e a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem

A Procuradora-Geral da República recusou comentar o processo de nomeação. 
A ministra da Justiça, por seu turno, diz que nada tem a ver com o seu trabalho, mas com a defesa de um mandato único.

Soube quinta-feira pelas 20h00 que Lucília Gago seria a sua sucessora. 
A procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, não quis explicar como recebeu a informação, nem sequer pronunciar-se sobre todo o processo de decisão que se arrastou nas últimas duas semanas até saber se seria ou não reconduzida. 
Ainda assim, afirma que sai de “consciência tranquila”, apesar de não ter tido tempo para fazer tudo o que queria.

À margem da conferência que põe fim ao projeto Ethos, um programa de formação de magistrados para a área da corrupção impulsionado pela própria Joana Marques Vidal, a magistrada falou alguns minutos para os jornalistas.  
Sobre uma possível recondução, a procuradora-geral afirmou que essa hipótese nunca lhe foi sequer colocada. 
“Não me vou pronunciar sobre hipóteses”, afirmou, recusando confirmar se mostrou disponibilidade para continuar no cargo ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, como então foi noticiado. 
“Considero este o normal funcionamento das instituições, não vejo aqui nada de estranho”, afirmou.

Joana Marques Vidal disse considerar normal este sentimento de que não fez tudo. 
“O mandato é de seis anos, podia ser nove anos, 12, aquilo que a constituição permitisse”, que manteria essa sensação. 
Significa que “não cristalizou”. 
Sublinhando um cenário de trabalho com uma “grande carência”, falando da falta de meios e de magistrados, em que muito contou com a “motivação” de muitos profissionais, disse que é importante olhar o  MP não apenas para a parte criminal, mas para outras competências do MP, como na garantia do direito à cultura, ao património e ao ambiente da comunidade. 
“Fizemos alguns passos, mas muito pequenos”, disse, explicando que dadas as limitações, teve de fazer opções. 
“Fiz o máximo que podia fazer dentro das minhas capacidades”. 
Ficou o recado dado para a sua sucessora, a quem se limitou a desejar os “melhores êxitos”, sem tecer qualquer comentário ao seu percurso.

Quando confrontada sobre os megaprocessos que marcaram o seu mandato, a magistrada lembrou que o início dos processos não está “dependente” dos procuradores e que não são eles que escolhem as participações. 
“O início dos processos decorre da aplicação da lei, quando há participações nós investigamos e se há indícios acusa-se, senão arquiva-se. Não há perseguições políticas nem pessoais”, deixou claro.

“Isto não tem nada a ver com Joana Marques Vidal”, garante ministra
Antes de Joana Marques Vidal, foi a ministra da Justiça Francisca Van Dunem quem prestou esclarecimentos. 
A governante deixou claro que no processo de escolha do novo Procurador-Geral foram ouvidos vários procuradores-adjuntos próximos do cargo para garantir alguma “continuidade no trabalho que está a ser feito”. 
Por isso a escolha de Lucília Gago, “uma pessoa capaz com grande formação com uma experiência transversal no MP” que começou por trabalhar no DIAP, numa secção relacionada com crime económico-financeiro, depois família e menores, quando foi para o Tribunal da Relação continuou a fazer a área criminal trabalhando diretamente com recursos penais e foi diretora do DIAP até há muito pouco tempo “sinónimo que existem hoje no MP pessoas que têm percursos abertos e com várias valências”

A ministra recusou fazer qualquer balanço do mandato, até porque a autonomia prevista no estatuto dos magistrados o impede. 
E deixou claro que o que está em causa na não recondução de Joana Marques Vidal não é o seu desempenho, mas uma questão de “princípio de um único mandato” por ser a solução “que melhor respeita a autonomia do MP”.  
“Isto não tem nada a ver com Joana Marques Vidal, mas com uma questão de princípio”, sublinhou.

“Espero que o Dr. Amadeu Guerra continue no DCIAP”, diz presidente do sindicato
Também à margem da conferência “Combate à Corrupção – Perspetivas de futuro”, o presidente do Sindicato dos Magistrados Ministério Público, António Ventinhas, lembrou que a equipa com quem Lucília Gago escolher trabalhar também será “muito importante” para o seu mandato. 
“Espero que o Dr. Amadeu Guerra continue no DCIAP (Departamento Central de Investigação e Ação Penal). 
Seria muito mau para o Ministério Público se ele fosse embora neste momento”, disse Ventinhas. 
Sem saber se o procurador se irá jubilar no próximo ano de 2019, o responsável repetiu a importância da sua manutenção no cargo.

António Ventinhas sublinhou, ainda, a importância da escolha do vice-Procurador-Geral, agora Adriano Cunha, responsável por “toda a máquina” da Procuradoria. 
E aproveitou para lembrar a falta de magistrados recentemente apontada pelo próprio Conselho Superior do Ministério Público: faltam 250 magistrados no Ministério Público.





















Lucília Gago: A “magistrada discreta” que “não gosta de exposição mediática”

PGR
Diogo Lopes    20/9/2018, 23:19


















A nova procuradora-geral da Republica foi diretora do DIAP de Lisboa sem ninguém a conhecer ao pormenor. 
Até agora, isto é o que se sabe sobre ela.

Lucília Gago: 62 anos de idade e 37 de carreira no mundo da justiça portuguesa. 
A nova procuradora-geral da República, que sucede a Joana Marques Vidal, destaca-se principalmente pela sua forte ligação aos temas da justiça aplicados à Família e é tida por António Costa como alguém com capacidade para manter a “continuidade da linha de salvaguarda do Estado de Direito Democrático, do combate à corrupção e da defesa da Justiça igual para todos, sem condescendências ou favoritismos para com ninguém”. 
Quem é a “magistrada discreta” que “não gosta de exposição mediática”?

De nome completo Lucília Maria das Neves Franco Morgadinho Gago, esta lisboeta que nasceu a 26 de agosto de 1956 é, desde 2017, responsável e fundadora do Gabinete de coordenação a nível nacional dos magistrados do Ministério Público na área da Família, da Criança e do Jovem, que faz parte da PGR e foi criado pela própria a convite da própria Joana Marques Vidal.

Formada em Direito pela Universidade de Lisboa (1978), ingressou no Centro de Estudos Judiciários dois anos depois, e 1980 — casa à qual regressaria entre os anos de 2012 e 2016, para assumir funções como docente e coordenador na área da família e menores — período no qual assinou vários e-books, um deles intitulado “Violência Doméstica – Implicações sociológicas, psicológicas e jurídicas do fenómeno”.

Em 1994, depois de trabalhar como delegada do procurador da República, foi promovida a Procuradora da República, tendo exercido funções numa Vara Criminal de Lisboa, no Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa e no Tribunal de Família e Menores de Lisboa. 
Nessa mesma instituição chegou a exercer numa secção especializada em crimes cometidos no exercício de funções públicas ou políticas, corrupção, branqueamento de capitais e criminalidade económico-financeira.

O caso das viagens do Euro 2016 e da morte de dois Comandos foram alguns dos mais mediáticos em que esteve envolvida. 
Foi indicada ao Conselho Superior do Ministério Público, órgão de gestão desta magistratura, por Joana Marques Vidal para substituir Maria José Morgado como líder do DIAP de Lisboa. 
A votação deste Conselho Superior deu-lhe uma vitória quase unânime — 14 votos a favor contra duas abstenções. 
No discurso proferido por Joana Marques Vidal na cerimónia de tomada de posse de Lucília Gago enquanto diretora do DIAP, a agora ex-procuradora afirmou: “Sabemos que as suas qualidades humanas e profissionais, a sua vasta experiência como Magistrada do Ministério Público na jurisdição criminal, bem como noutras jurisdições, fazem de si a escolha acertada. 
Muito lhe agradecemos o ter aceitado este cargo”

Lucília é casada com outro procurador, Carlos Gago, que em tempos ocupou um lugar na direção da PJ e chegou a ser um membro destacado do PCTP/MRPP. 
Num artigo de 2016 do jornal Expresso, um magistrado que não quis ser identificado descreveu-a como sendo “uma magistrada de fibra que não tem muita experiência na área criminal e não gosta de exposição mediática”.

Apesar de ser descrita como recatada e evitar a exposição mediática, o nome de Lucília Gago começou a ser mais pronunciado há cerca de um ano, por causa do processo referente à morte de dois recrutas dos Comandos durante um exercício de formação. 
A nova PGR, na categoria de diretora do Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa, negou o pedido de recusa de procuradora feito por Alexandre Lafayette, o advogado dos militares que foram constituídos arguidos. 
Alegando que Cândida Vilar — que estava a conduzir a investigação —  não estava “mentalmente sã” e que devia ser observada “com urgência, por uma junta médica de psiquiatras e psicólogos”, o advogado pediu o seu afastamento do processo. 
Lucília Gago negou o pedido e isso fez com que Lafayette dissesse, numa exposição que enviou à PGR, que a diretora recusou “criminosamente” o pedido que tinha feito.