domingo, 9 de setembro de 2018

Suécia: uma corrida eleitoral ao sabor do debate sobre a imigração

SUÉCIA
António Saraiva Lima
9 de Setembro de 2018, 7:00 
Suécia recebeu 26 mil refugiados em 2017. Dois anos antes recebera 162 mil.

Amplamente posta em causa pela extrema-direita, política migratória foi tema quase exclusivo na campanha. Restrições à entrada de refugiados impostas pelo Governo não estancaram o debate.

“A Suécia deixou que a questão da imigração sequestrasse a agenda política”. 
A frase, atribuída a um colaborador da edição sueca do site noticioso The Local, resume bem o contexto eleitoral no país. 
Porque foi o tema a que candidatos, eleitores, jornalistas e analistas dedicaram mais tempo e para onde canalizaram grande parte da sua atenção nos meses que antecederam as eleições deste domingo. 

Para esta situação muito contribuíram os Democratas Suecos, o partido de extrema-direita que quase duplicou os seus apoios em quatro anos e cujo discurso nacionalista e xenófobo compeliu o establishment a guinar, também ele, à direita. 
Na política e no discurso. 

Com cerca de 18% da sua população de dez milhões nascida fora do país, a Suécia teve durante muitos anos a fama de ser um dos Estados mais abertos à imigração e à promoção da sociedade globalizada e multicultural. 
Conseguiu-o através de um posicionamento geopolítico neutral, de uma política migratória flexível e do aproveitamento da mão-de-obra estrangeira para manter a sua economia a crescer a um ritmo superior aos restantes parceiros europeus.


Mas a abertura das suas portas a mais de 162 mil requerentes de asilo em 2015 – mais do que qualquer outro Estado-membro em termos de proporção populacional – não foi bem recebida por uma larga fatia da população. 
Os suecos começaram a temer pelo bom funcionamento dos serviços públicos e do generoso e afamado Estado social. 

O aumento da criminalidade urbana e a ineficaz integração de algumas comunidades de imigrantes foram entendidas como resultado directo da política pró-imigração do Governo social-democrata e ofereceram aos marginalizados Democratas Suecos uma oportunidade de dar voz a estes eleitores. 

“As pessoas que sempre tiveram uma visão céptica em relação aos imigrantes e às minorias foram politizadas pela mensagem dos Democratas Suecos e pelo debate político sobre o tema. 
Agora colocam abertamente a imigração e a integração no centro do seu entendimento sobre os problemas da Suécia. 
E estão mobilizadas”, explica ao PÚBLICO Daniel Poohl, chefe-de-redacção e porta-voz da Expo, uma revista sueca que se dedica ao estudo dos movimentos racistas.

Pressionado pela opinião pública, o primeiro-ministro Stefan Löfven cedeu. 
No final de 2015 e dois meses depois de ter proclamado “a minha Europa não constrói muros, a minha Europa recebe refugiados”, aprovou uma das políticas de asilo mais restritivas da União Europeia que, dificultou, por exemplo, a reunificação de muitas famílias. 
“A Suécia precisa de respirar”, justificou.

De acordo com dados do Eurostat e do Alto-Comissariado da ONU para os Refugiados, a Suécia passou de 162 mil refugiados acolhidos em 2015 para 28 mil em 2016 e 26 mil no ano passado.

A nova estratégia do Governo não travou, contudo, o ímpeto da extrema-direita que, a subir em flecha nas intenções de voto – agregam quase 20% dos votos segundo as sondagens – fez questão de manter o debate sobre a imigração no centro da acção política e da corrida eleitoral, chamando a si os louros pela readaptação política de Löfven, do Partido Social-Democrata ou dos Moderados.

Daniel Poohl rejeita, no entanto, que a nova realidade tenha sido o resultado de um “plano estratégico” dos Democratas Suecos. 
“Mais do que o partido, importa a existência deste tipo de sentimento anti-imigração junto de muitos eleitores. 
Foi esse sentimento que forçou os restantes partidos políticos a adaptarem as suas políticas”, considera o investigador.

Da adaptação da política migratória, passou-se para a monopolização temática do debate eleitoral e para o extremar das posições, que vão agora a votos. 
“Esta eleição é um referendo entre o Estado social e a imigração continuada. 
E eu escolho o Estado social”, resume o líder dos Democratas Suecos, Jimmie Akesson.

anonio.lima@publico.pt


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