sábado, 15 de agosto de 2015

A RECESSÃO MUNDIAL ESTÁ DESTINADA A AGRAVAR-SE

PÁGINA GLOBAL globalmente, destaque à lusofonia
Prabhat Patnaik 
sexta-feira, 14 de agosto de 2015
























Mais de sete anos após o início da crise do mundo capitalista não há sinal de qualquer recuperação e hoje as perspectivas parecem ainda mais negras do que antes. 
De facto, enquanto o mundo capitalista avançado continua atolado na crise, ela agora está a propagar-se por todo o globo, mesmo para países como a Índia e a China que inicialmente pareciam haver escapado ao seu impacto. 
A taxa de crescimento do PIB indiano está a desacelerar; além de que o sector manufactureiro continua a testemunhar estagnação quase absoluta. 
A taxa de crescimento de 2,3 por cento nas manufacturas em 2014-15, ainda que exígua representou uma melhoria em relação aos 0,8 por cento em 2013-14 e foi geralmente extrapolada como uma viragem. 
Mas a taxa de crescimento em Maio, o mês mais recente para o qual temos números, está outra vez nos 2,2 por cento (em relação ao mesmo mês de um ano atrás). 
Também na China, a taxa de crescimento do PIB está a reduzir-se; isso acontece no seu sector industrial que testemunhou uma expansão fenomenal durante longo tempo. 
E uma vez que a China emergiu como grande compradora de matérias-primas, incluindo as da América Latina, um arrefecimento da sua taxa de crescimento industrial implica um entrave a várias economias do terceiro mundo cujas fortunas haviam melhorado devido ao boom chinês.

A crise, em suma, está a tornar-se generalizada por todo o globo, mesmo que haja uma pequena melhoria nas economias dos países capitalistas avançados. 
A situação quanto à Eurozona é bem conhecida: todo o Sul da Europa, e mesmo a França, é atingido duramente pela crise. 
E a Grã-Bretanha continua a sofrer com as medidas de "austeridade" draconianas impostas pelo governo Cameron.

IMPRESSÃO ENGANOSA 

Os Estados Unidos dão a impressão de serem uma excepção a este fenómeno, mas esta impressão é enganosa. 
Apesar de a taxa de desemprego nos EUA ter baixado para 5,3 por cento em Julho de 2015, a qual é muito mais baixa do que a do pico pós crise de cerca de 10 por cento, houve uma queda significativa na dimensão da força de trabalho. 
Tal queda é uma ocorrência comum durante recessões e exprime o que muitas vezes é chamado de efeito "trabalhador desencorajado". 
O declínio na taxa de emprego é explicado, pelo menos parcialmente, por esta queda, ao invés de um ressuscitar da economia.

Um cálculo muito simples mostraria que, apesar de qualquer melhoria que a economia estado-unidense possa ter experimentado ultimamente (sobre isto, ver mais adiante), a taxa real de desemprego permanece muito alta. 
Pouco antes da crise, a taxa de desemprego nos EUA era cerca de 5 por cento e o rácio emprego-população era de 63,3 por cento, o qual dá um rácio força de trabalho-população de 66,6 por cento. 
Vamos aceitar este número (o que significa aceitar a questionável estimativa oficial de taxa de desemprego de 5 por cento na véspera da crise). 
O rácio emprego-população em Julho de 2015 situava-se nos 59,2 por cento. 
Com o mesmo rácio força de trabalho-população que existia pouco antes da crise, isto significaria uma taxa de desemprego de 11 por cento! 
O facto de ao invés de uma taxa de desemprego de 11 por cento termos uma de apenas 5,3 por cento nos EUA é porque um certo número de trabalhadores simplesmente abandonou a força de trabalho. 
E eles assim fizeram não porque nesse ínterim se houvessem dedicado a alguma outra actividade que valesse a pena, como obter educação, mas por causa das perspectivas negras de obtenção de emprego. 
A economia dos EUA, em suma, muito embora possa a estar a experimentar melhoria marginal, continua a ser afligida pela crise. 
E isto assim é apesar do facto de que o Federal Reserve dos EUA tem mantido suas taxas de juro básicas próximas do nível zero desde a cerca de sete anos.

Uma vez que a política orçamental – sob a hegemonia do capital financeiro – destinada a estimular o nível de actividade é evitada, mesmo numa economia como a dos EUA que não tem qualquer legislação de "responsabilidade orçamental", e cuja divisa sendo "tão boa quanto o ouro" proporciona ao seu governo um enorme grau de liberdade para actuar com impunidade em assuntos fiscais (uma vez que é muito improvável que enfrente qualquer fuga de capitais), a política monetária torna-se o único instrumento para fazer reviver a economia. 
E o US Federal Reserve tem feito tanto quanto podia com este instrumento. 
(Ele podia, logicamente, ter taxas de juro nominais negativas através da aplicação de um imposto sobre os haveres de balanços monetários, mas isto não é claramente uma proposição prática). 
Contudo, notavelmente, não há sinais de qualquer recuperação perceptível.

Mesmo a melhoria marginal que se verificou na economia dos EUA deve-se à queda dos preços do petróleo. 
A principal fonte da melhoria tem sido o gasto do consumidor privado, não a despesa do governo ou o investimento privado. 
E este maior gasto do consumidor privado tem sido estimulado pela queda dos preços do petróleo, os quais, para uma economia dependente do automóvel como os EUA, com substancial consumo privado de refinados, é uma bênção para famílias privadas. 
Elas têm utilizado esta bênção para aumentar suas compras de uma variedade de bens e serviços produzidos internamente, cuja procura acrescida provocou algum aumento na produção.

Entretanto, o que é notável é o facto de que este aumento na produção não provocou qualquer aumento do investimento privado, o que sugere que os capitalistas têm pouca confiança na persistência deste aumento. 
Estamos portanto numa situação semelhante àquela que, segundo Harry Magdoff , prevaleceu nos Estados Unidos no fim da década de 1930, quando a produção do sector dos bens de consumo havia recuperado devido, entre outras coisas, a maiores gastos governamentais sob o governo Roosevelt, mas o sector de bens de capital havia permanecido a braços com uma maciça capacidade inutilizada devido à falta de confiança dos capitalistas na continuidade da recuperação. 
Foi só a preparação para a guerra, sob a sombra da ameaça nazi que deu origem a maior despesa militar, que arrancou o sector de bens de capital dos EUA para fora da crise (uma vez que grande parte do hardware militar é produzido nesse sector). 
Apesar de a situação nos EUA de hoje recordar um pouco aquele período, com algum reviver na despesa de consumo mas nada no investimento privado, não existem tais nuvens de guerra no horizonte (felizmente) que pudessem causar uma plena recuperação no emprego e na produção.

MAIOR FARDO SOBRE OS PRODUTORES DE COMMODITIES PRIMÁRIAS 

Há um ponto que deveria ser observado quanto à ascensão da despesa de consumo nos Estados Unidos. 
Vimos que estava ligada ao declínio dos preços do petróleo, os quais por sua vez tendem a estar correlacionados com os movimentos de preços de outras commodities primárias. 
Uma vez que economias não metropolitanas são exportadoras líquidas destas commodities, o que isto significa é que mesmo a limitada revivificação que ocorreu na economia dos EUA foi associada à transferência de um fardo, na forma de uma queda de preços de commodities, para estas outras economias.

Na teorização do Comitern nos anos trinta, esta ideia, de os países avançados transferirem o fardo da crise para as economias da periferia, desempenhou um grande papel. 
Mas, com a "Revolução Keynesiana" e a ênfase na procura agregada, ela tendeu a recuar para segundo plano, uma vez que as duas questões, nomeadamente a da mudança dos termos de troca entre bens manufacturados e commodities primárias, e a questão da procura agregada nas metrópoles, não podiam ser teoricamente ligada de modo adequado. 
A actual conjuntura, entretanto, revela uma ligação entre estas duas questões: uma mudança nos termos de comércio contra commodities primárias no contexto de hoje causa, ceteris paribus, um aumento da procura agregada para os países avançados, através de uma maior despesa de consumo que é dirigida pelos consumidores aos seus próprios bens porque têm de gastar menos com petróleo e outras commodities primárias. 
Mesmo a limitada revivificação actual da procura nos EUA tem, em suma, como contrapartida um maior fardo sobre os produtores de commodities primárias.

Mas mesmo esta limitada revivificação nos EUA é improvável que perdure muito. 
A questão de uma alta da taxa de juro nos EUA tem sido falada desde há algum tempo. 
Isto não acontece porque os EUA tenham ficado afundados em inflação, longe disso na verdade. 
A queda global nos preços das commodities primárias, que acaba de ser mencionado, remove a inflação da lista de preocupações imediatas nos EUA. 
E mesmo pelos padrões do capital financeiro, o qual evita mesmo inflação moderada pois ela desgasta o valor real dos activos financeiros que possui, a inflação actual nos EUA está longe de "preocupante": a actual taxa de inflação de cerca de 1,5 por cento cai bem abaixo do que o Federal Reserve considera a "meta inflacionária", a qual é de 2 por cento. 
Ainda assim, a aversão do capital financeiro a taxas de juro zero ou próximas de zero está a pressionar o Fed a elevar estas taxas. 
Ele adiou a decisão até Setembro, mas é provável que então efectue algum aumento de taxas. E quando isso acontecer, a recessão mundial tornar-se-á ainda mais acentuada.

O fortalecimento do dólar, já a caminho, dará novo impulso e piorará o défice corrente na balança de pagamentos dos EUA o que reduzirá a procura agregada no país. 
Isto se somará à redução que taxas de juro mais altas provocariam de qualquer modo através da redução de despesas devido a custos mais altos para a tomada de empréstimos. 
E enquanto a recessão estado-unidense piora, o resto do mundo também experimentaria uma pioria porque teria de ascender taxas de juro em resposta às taxas americanas. 
Na verdade, uma queda relativa no valor das divisas do resto do mundo em relação ao dólar deveria aumentar suas exportações líquidas para os EUA. 
Mas o aumento inflacionário associado à depreciação das divisas forçaria seus governos a cortarem despesas, cujos efeitos na redução da procura mais do que compensariam qualquer aumento da procura que a depreciação da divisa pudesse promover.

E haveria um factor adicional a actuar na mesma direcção, o qual é a não disponibilidade de influxos de dólares no caso de um aumento nas taxas de juros dos EUA. 
Tais influxos actualmente sustentam os défices em conta corrente de países como a Índia, mas se eles não estiverem mais disponíveis então estes países seriam forçados a cortar na sua procura agregada e a adoptar medidas de "austeridade" para restringir seus défices correntes.

Em suma, o capitalismo mundial parece destinado a um agravamento da crise. 
Mesmo depois de sete anos após o seu surgimento, a crise persiste apesar de as taxas de juro dos EUA serem deitadas abaixo para zero ao longo deste período. 
E quando estas taxas aumentarem, o que eles estão em vésperas de fazer sob a pressão do capital financeiro, a crise só pode piorar. 
O capitalismo hoje parece muito mais afundado na crise do que a maior parte das pessoas, incluindo mesmo muitos na esquerda, imaginam. 
09/Agosto/2015


resistir_info


A dívida mundial já vai nos US$60 milhões de milhões (trillion), sendo um terço da mesma da responsabilidade dos EUA.
A quota parte de Portugal nessa dívida é de 0,49%. 
Ou seja, ela é exactamente igual à da Rússia – também de 0,49%. 
Compare-se a diferença entre a dimensão das economias destes dois países...
Se ao invés de medir a dívida mundial em números absolutos ela fosse medida em percentagem do PIB, a dívida da Rússia seria próxima de zero. 
E a de Portugal já anda próxima dos 135% do PIB, com tendência para aumentar. 
Vale a pena ler o livro de Cédric Durand acerca do capital fictício
O desaparecimento do mesmo é a condição prévia indispensável para o desaparecimento da crise do capitalismo.


DÍVIDAMUNDIAL
US $ 60 trilhões de dívida World in One Visualization
JEFF DESJARDINS em 06 de agosto de 2015 em 16:08
Duas semanas atrás, publicamos um post mostrando a economia mundial em uma visualização.
Na seção de comentários correspondente, um usuário nos perguntou se poderíamos montar uma visualização semelhante, mas em vez afiando dentro em dívida mundo.

Visualização de hoje decompõe $ 59.700.000.000.000 da dívida mundo por país, bem como destacar rácio da dívida em relação ao PIB de cada país através de cores.
Os dados são do FMI e cobre apenas a dívida do governo público. Exclui a dívida dos cidadãos e das empresas do país, bem como passivo a descoberto que não são ainda tecnicamente ainda incorridos. Todos os números são baseados em USD.

Os números que mais se destacam, especialmente quando comparado com o gráfico anterior economia mundial:

Os Estados Unidos constitui 23,3% da economia mundial, mas 29,1% da dívida mundo.
É rácio da dívida em relação ao PIB é 103,4%, utilizando dados do FMI.
Japão torna-se apenas 6,18% da produção econômica total, mas somou 19,99% da dívida global.
China, segunda maior economia do mundo (e maior por outras medidas), é responsável por 13,9% da produção.
Eles têm apenas 6,25% da dívida mundo e um rácio da dívida em relação ao PIB de 39,4%.
7 dos 15 países com a dívida mais totais são europeus.
Juntos, excluindo a Rússia, o continente europeu detém mais de 26% da dívida total mundial.
Combinando a dívida dos Estados Unidos, Japão e Europa juntos responde por 75% da dívida total global


ECONOMIA MUNDIAL NUMA VISUALIZAÇÃO
A Economia Mundial em uma Visualização
JEFF DESJARDINS julho em 22, 2015, 16:03

Visualização de dados de hoje é o mais simples colapso da economia mundial que temos visto.
Não só é dividida para mostrar o PIB de dezenas de países em relação uns aos outros com base no tamanho, mas também divide sutilmente cada economia em seus principais setores: agricultura, serviços e indústria.
O mais leve sombra em cada país corresponde à atividade econômica mais primitiva, que é a agricultura.
A máscara média é a indústria, e a tonalidade mais escura corresponde a serviços, o que tende a tornar-se uma grande parte do PIB das economias desenvolvidas na economia mundial.

Para dar um passo mais longe, a visualização também sombreia os países por geografia continental, para ver facilmente as contribuições econômicas relativas de América do Norte, Europa, América do Sul, Ásia, Oceania e África.




LIVRO DE CÉDRIC DURAND ACERCA DO CAPITAL FICTÍCIO
O capital fictício, como a finança se apropria do nosso futuro
por Daniel Vaz de Carvalho
 
A crise de 2007-2008 com as "políticas de rigor" e "reformas estruturais" fez cair a máscara à social-democracia. (…) 
A soberania dos mercados sobrepõe-se à dos povos 
Cédric Durand
1 – Natureza do capital fictício. 

A austeridade já tem sido considerada como o "vírus capitalista". 
É uma imagem. 
Na realidade, trata-se do remédio errado, como uma seringa infetada. 
O capitalismo está de facto atacado de uma doença letal: o capital fictício. 
Sem eliminar este "vírus" nenhum remédio será verdadeiramente eficaz. 
É isto que Cédric Durand nos evidencia. 

A importância deste livro reside na análise de um tema fundamental do marxismo, o capital fictício, aliado a uma linguagem simples, mas absolutamente rigorosa e factual, em que os dogmas do neoliberalismo são totalmente desmontados. 
Só a escandalosa censura existente impede a divulgação e discussão destas análises até nas universidades. 

A natureza do capital fictício reside em que os títulos financeiros são apenas promessas de valorização real, o que destrói o mito da autonomia do sistema financeiro como variável determinante do sistema económico. 
O capital fictício é uma ilusão e um desvio de recursos. (p. 56, 57) 
Tem consistido no aumento vertiginoso da quantidade de valor validado por antecipação à produção de mercadorias. (p. 90) 

O capital fictício, é de facto um produto de contradições económicas e sociais insolúveis. (p. 7) 
Encarna valor, mas não resulta da produção de valor, resulta de transferências de rendimentos a partir de atividades produtivas, isto é, rendimentos do trabalho e lucros tirados da produção de bens e serviços. (p. 105) 

Marx identifica três formas de capital fictício: a moeda crédito, os títulos de dívida pública e as ações. 
Cédric Durand desenvolve este conceito aplicando-o à realidade atual, apresentando-o como uma apropriação da mais-valia produzida na esfera produtiva, desmontando o aparente enigma dos lucros sem acumulação, resultantes das operações financeiras e do controlo das redes produtivas internacionais. (p. 178) 

Podem ser caracterizados como lucros financeiros os juros, os dividendos e as mais-valias realizadas com a venda de ativos. 
Como fontes dos juros distinguem-se os resultantes do endividamento das famílias para terem acesso ao consumo (lucros de alienação); os resultantes do endividamento das empresas, que se tornam críticos nos períodos de crise; os lucros políticos de dívida pública. (p. 106-112) 

São também fontes de lucros financeiros a atividade como intermediários; o chamado lucro dos fundadores (diferença entre o preço dos ativos e valorização no mercado bolsista); os lucros políticos obtidos com recapitalização, nacionalização dos prejuízos, benefícios fiscais, etc. (p. 119, 123) 

Nos EUA a parte dos 1% mais ricos na detenção de dívida pública passou de 16 para 40% entre 1970 e 2010. 
Em 1970 a dívida dos 11 países mais ricos representava 30% do PIB, em 2012, nos EUA 114%, no Reino Unido 137%. 
O valor financeiro obtido por antecipação do processo de valorização futura não cessou de aumentar (p. 75) 

Um estudo sobre subvenções públicas implícitas nos lucros das grandes instituições financeiras concluía que existia uma subvenção implícita de 233 mil milhões de euros em 2012, 1,8% do PIB da UE e montantes da mesma ordem desde 2007. 
Sem isto os bancos registariam prejuízos consideráveis. 
Os seus lucros são portanto subvencionados. 
A privatização dos benefícios das atividades financeiras é, pois, perfeitamente ilegítima. (p. 122) 

2 – A financeirização e os "mercados eficientes" 

A liberalização financeira conduziu à alta dos lucros financeiros, donde a uma taxa mínima de rentabilidade nos investimentos, ao aumento dos dividendos entregues aos acionistas, à diminuição dos lucros retidos pelas empresas e consequentemente ao abrandamento da acumulação, à sobreprodução e ao desemprego. (p. 154) 
A financeirização não conduziu (como propagandeado) ao aumento do investimento, ao "crescimento e emprego", mas ao seu declínio (p. 50). 
Os países da OCDE de rendimento elevado detinham em 1990, 80% do PIB mundial, em 2012 reduzira-se para 61% (p. 8, 9). 

Numa estrutura Ponzi (especulativa) o fluxo de rendimento acaba por não permitir reembolsar nem os juros nem o principal da dívida. 
Por conseguinte, o endividamento não pode senão aumentar e conduzir a falências (p. 40). Algo de semelhante se passa com os Estados. 
Heyman Minsk passou a maior parte da carreira a defender a tese de que os sistemas financeiros estão por natureza sujeitos a acessos especulativos. 
Foi considerado um "radical" (p. 37). 

O otimismo na financeirização, ao qual não foram poupados os reguladores, levou ao abrandamento das normas prudenciais e à desregulamentação, potenciando os riscos. 
O paradoxo da intervenção pública como tem sido realizada consiste em que os operadores financeiros são tanto mais inclinados a assumir riscos quando sabem que o banco central tudo fará para impedir o risco sistémico de se concretizar (p. 42, 43). 

Os defensores da linha de Hayek de que o mercado é um processo de revelação de conhecimento disperso aplicável aos mercados financeiros, negligenciam a dinâmica da criação e preservação do capital fictício e os efeitos de distorção de informação que daí decorrem (p. 138). 
O que conduz a má apreciação dos riscos e más decisões de investimento. 
Desde 1980 a desregulação financeira, criou períodos de expansão financeira que terminaram sempre em crise (p. 45). 

O capital fictício é tanto um acelerador do desenvolvimento capitalista como fautor de crises, esta ambivalência dá aos seus zeladores no dizer de Marx "o caracter híbrido de escroques e profetas". (p. 63) 
Grandes bancos manipularam em seu benefício durante mais de duas décadas as taxas Libor e as taxas de câmbio das principais moedas. 
A procura do desempenho a qualquer custo teve como corolário a fraude, a vigarice. 
"Os delitos estão presentes desde sempre no mercado e raramente são objeto de procedimento judicial" (B. Madoff, ex-presidente da NASDAQ) (p. 17). 

A Golman Sachs que reconheceu ter cometido práticas fraudulentas, teve em 2010 uma multa de 550 milhões de dólares, cerca de 14 dias dos lucros desse ano (p. 19). 
Os sistemas de crédito paralelo contornam as normas sobre reservas obrigatórias, representam canais de difusão das crises a que as avaliações das agências de rating acrescentam riscos (p. 82). 

A legitimação do liberalismo financeiro foi apoiada por economistas e universitários. 
Larry Summers [1] havia recebido 20 milhões de dólares em anos em que defendeu incansavelmente o liberalismo financeiro. 
Verificou-se que 19 eminentes universitários diretamente implicados nas reformas financeiras estavam também ligados ao sector privado sem nunca o terem declarado (p. 33). 

Como aprendizes de feiticeiro os agentes financeiros foram apanhados na sua própria armadilha e não anteciparam o desastre. 
Porém (para eles) tudo continua como se nada se tivesse passado, continuando a serem considerados racionais e omniscientes, 
A cegueira ao desastre e ao conformismo dominam o sistema financeiro (p. 24). 

3 – A vingança dos rentistas 

O aumento dos lucros financeiros poderia sugerir que a vingança dos rentistas era a explicação para o paradoxo dos lucros sem acumulação. 
Porém as (grandes) empresas também obtiveram rendimentos crescentes das suas atividades financeiras (p. 158). 
No entanto, em prejuízo da sua atividade produtiva, em detrimento do "crescimento e emprego", a fórmula com que a direita e a social-democracia procuram iludir as camadas proletárias. 

A reconfiguração do tecido produtivo alinha-se em função do interesse dos acionistas em termos de rendimento a curto prazo. 
Consiste em "reestruturar e distribuir", isto é reduzir o emprego e separar-se de atividades menos rentáveis, estabelecendo subcontratos. 
O reforço do poder dos acionistas e a globalização afetou negativamente o investimento estabelecendo uma norma de rentabilidade mínima aquém da qual os projetos produtivos são eliminados. (p. 170) 
Esta reconfiguração visa libertar mais-valias bolsistas e dividendos, mais que o aumento da eficiência económica, modificando a relação de forças entre acionistas, gestores e trabalhadores (p. 158, 159). 
É uma lógica predadora: trata-se de garantir que o capital fictício seja sempre convertível em dinheiro, isto é, bens e serviços (p. 188). 

Nas vésperas da crise atual, 147 sociedades controlavam 40% do valor do conjunto das TN, sendo elas próprias dominadas por 18 entidades financeiras (p. 114). 
Estabelece-se uma hierarquia de capitais, na qual os centros capitalistas diretamente ligados aos mercados financeiros dispõem de um poder de mercado que lhe permite transmitir os choques conjunturais às empresas da periferia com o objetivo de atingir e ultrapassar os rendimentos garantidos aos acionistas. 
A pressão traduz-se na degradação das condições salariais (p. 163). 

O parasitismo dos países mais avançados estabelece como que um tributo aos países mais fracos, sob a forma de produtos, recursos naturais e lucros, verificando-se naqueles países uma parte crescente de lucros recebidos do estrangeiro (p. 181). 
Porém, simultaneamente cresce o peso de atividades cuja dinâmica tende a reduzir-se, crescendo aquelas em que a produtividade estagna (p. 173). 

4 – Uma transferência de riqueza organizada a nível global 

Os grandes bancos de investimento e os fundos especulativos organizam a transferência de riqueza a nível global. 
Com a estabilidade financeira visa-se fazer prevalecer as exigências do capital financeiro sobre as aspirações das populações (p. 124). 

Nos EUA os 1% mais rico apoderaram-se de 95% dos ganhos entre 2009 e 2013, aumentando os seus rendimentos em 31,4%. 
O total dos montantes despendidos pelos Estados para apoiar o sector financeiro (recapitalizações, compra de ativos, nacionalizações", garantias, injeções de liquidez) em 2008 e 2009 foi avaliado pelo FMI em 50,4% do PIB mundial! (p. 51) 

Outro aspeto é a liberalização do comércio e dos fluxos de capitais, estabelecendo um exército de reserva do trabalho a nível global. 
A troca desigual proporciona a capacidade das TN dos países dominantes para remunerar os seus agentes financeiros através dos ganhos provenientes das relações mercantis assimétricas com os seus fornecedores dos países dominados (p. 128). 

Com o enfraquecimento do movimento operário o imperialismo e a oligarquia financeira reforçaram o seu poder (p. 184). 
Em 2006 havia 66 milhões de trabalhadores, em países ou zonas em que impostos e regulamentações são quase inexistentes, em particular as do trabalho, com fiscalização submetida aos interesses e exigências do patronato e salários de 1 € por dia (p. 177). 

Para Hayek as crises não são produzidas por excesso de produção mas por excesso de consumo (p. 60). 
Justificando assim os planos de austeridade que não são mais que créditos sobre os montantes futuros dos impostos dos quais a finança se apropria (p. 66). 

Ganha, pois, uma atualidade nova a famosa afirmação de Marx segundo a qual "numa certa fase do seu desenvolvimento, as forças produtivas materiais entram em conflito com as relações de produção existentes, ou, o que não é senão a sua expressão jurídica, com as relações de propriedade no seio das quais tinham existido até então. 
De formas de desenvolvimento das forças produtivas estas relações tornam-se no seu entrave" (p. 133). 

Perante as crises o sistema tem necessidade de relançamento para um rápido aumento dos lucros, recorrendo a choques exógenos, como guerras, contrarrevoluções, derrota dos assalariados, descoberta de novas fontes de matérias-primas (Ernest Mendel) (p. 139). 

Esta política não conhece limites e só pode ser posta em causa pela combatividade das camadas populares (p. 190). 
Eis o que resume as mensagens que propomos reter do livro de Cédric Durand.

[1] Antigo presidente da Universidade de Harvard, conselheiro de Obama e secretário do Tesouro de Clinton. 

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