segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Portugal. NOMES DO DESEMPREGO

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Domingos de Andrade – Jornal de Notícias, opinião
domingo, 9 de agosto de 2015

O jogo

A guerra dos números do desemprego é um dos episódios mais tristes desta pré-campanha. Porque o jogo é mórbido. 
Porque todos, Governo e Oposição, fazem bluff. 
Porque os números prestam-se a que todos tenham razão. 
E porque não há solução. 
Ou ela é demorada. 
Mas vamos aos números, juntando-lhes nomes. 
A tratar por tu, para os chamar até nós.

As peças

O Dinis tem 52 anos. 
Ainda manda currículos. 
Tomou-lhe o hábito. 
Até há meio ano, recebia subsídio. 
E mandava currículos. 
Mas já não pedia trabalho. 
Nem se sentia humilhado. 
Durante dois anos, quando o despediram, a ele e a mais uns quantos, para limpar a empresa e a tornar "interessante" para vender, bateu de porta em porta, até não pretender mais do que uns carimbos ou uns e-mails como resposta, para provar que andava à procura. 
Hoje, engrossa os 243 mil que baixaram os braços.

O António ainda resiste. 
Está nos 620,4 mil que, segundo o Instituto Nacional de Estatística, se encontravam no desemprego no último trimestre. 
São 48 anos, mais uns meses, a fazer de conta que sai de casa para trabalhar. 
Apareceram-lhe umas coisas, adaptáveis a um operário fabril. 
Mas o dinheiro que iria receber não chegava para as despesas. 
Disse não. 
Há coisas que a dignidade não merece.

O Diogo tem 28 anos. 
Acabou o curso há quatro. 
Faz biscates há três. 
Tanto trabalha 16 horas por dia, como nada. 
E vale tudo. 
É um enfermeiro pronto a servir. 
Está numa clínica, como poderia estar como auxiliar num centro de dia. 
O percurso é o mesmo da grande maioria dos recém-licenciados. 
Esteve um ano a receber a meias pela clínica e pelo Estado num estágio profissional. Acabou, entrou outro para o lugar dele, fez-se à vida. 
Trabalha quando tem, recebe quando calha. 
Há de emigrar. 
E sair das estatísticas. 
A subir ou a descer, terão sido 500 mil a sair do país nos últimos quatro anos.

Os jogadores

O Governo joga bem. 
Mas faz bluff. 
A taxa do desemprego teve uma quebra forte. 
E é, para o Governo que operou a maior mudança das leis laborais dos últimos 40 anos, um trunfo. 
Destruiu-se emprego. 
Mas o país estava falido. 
O empobrecimento foi violento, mas o país está hoje melhor. 
E a UGT, central sindical ligada ao PS, diz améns e também quer louros.

A Oposição joga bem, mas faz bluff. 
Ao coro do Bloco e do PCP, os socialistas juntam que o Governo é responsável pela maior destruição de emprego dos últimos 50 anos. 
Ou que a baixa taxa se deve aos incentivos do Estado. 
Mas não diz a cartada que tem. 
Porque nada se pode prometer sobre as areias movediças em que a economia se transformou. 
E prometer, hoje, tira votos. 
Mesmo os do Dinis, do António e do Diogo. 
Há neles uma esperança ténue nos números da coligação.

Estranha esperança.

Post scriptum - Os casos acima retratados são reais, salvaguardando a identidade, e não ficcionados como os que os cartazes do PS ostentam. Costa não quer mesmo ganhar eleições.

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