terça-feira, 12 de julho de 2016

Crise em Itália. Investidores fogem do risco e já cheira a 2008

Futuro da Banca
Filipe Paiva Cardoso
07.07.2016 / 00:10
Matteo Renzi primeiro-ministro italiano (Foto: REUTERS/Tony Gentile)

Banca italiana ameaça gerar nova crise financeira na Europa. Taxas de juro alemãs batem mínimos; as italianas sobem.

Com 360 mil milhões de euros em ativos tóxicos, a crise da banca italiana, agravada pelo impacto do brexit na economia europeia, está agora no centro das preocupações dos investidores. 
As ações dos bancos foram ao fundo. Lorenzo Bini, chairman do Société Générale, e Lorenzo Codogno, ex-diretor-geral do Tesouro Italiano, vieram já a público alertar que a situação acarreta o risco de catalisar uma nova crise na Europa, cujo sistema financeiro está não só fragilizado mas excessivamente interligado. 

O risco de contágio a toda a UE, desde logo ao gigante alemão Deutsche Bank, já está, aliás, a abalar o mercado de dívida pública – os juros alemães, franceses e holandeses bateram ontem níveis historicamente baixos, enquanto as taxas da dívida italiana subiram, sinal de que os investidores, face à incerteza, estão a fugir dos ativos de maior risco. “Há cada vez mais paralelismos com a crise de 2008”, explica a Bloomberg. 

“O valor de mercado dos bancos europeus tem vindo a descer desde há um ano, quando se tornaram claras as necessidades de capital”, diz João Queiroz, diretor de negociação do Banco Carregosa, ao Dinheiro Vivo. 
“Com a estagnação do crescimento, o aumento dos créditos em risco (…) e com os juros em mínimos é difícil imaginar um cenário mais adverso”, acrescenta. 
E o caso italiano só trouxe mais pressões sobre um sistema já no limite. 
“A situação da banca em Itália já tem vindo a contribuir para este cenário e os prémios de risco da banca dos países periféricos refletem esses efeitos. 
À medida que a situação se for agravando, maior será o risco da periferia.” 

Caso italiano e o elefante alemão 

Mas além da periferia, há ainda o elefante na sala, lembra o analista. 
“Hoje [ontem] as ações do Deutsche Bank voltaram a bater mínimos históricos. 
Tendo o Deutsche ativos que equivalem a 1/3 do PIB alemão, não é nada bom sinal quando o mercado lhe atribui um valor de apenas 18 mil milhões. 
É até bastante assustador.” 

Em Itália não se discute apenas o avanço de uma recapitalização para a banca, mas também o possível ignorar de regras europeias por parte do governo para forçar a recapitalização, avaliada em pelo menos 40 a 50 mil milhões. 
Matteo Renzi quer evitar as normas da União Bancária que obrigam à partilha de perdas com os privados. 
Mas ignorar estas regras será um novo golpe na credibilidade do projeto europeu e acarreta tantos riscos como o oposto. 

“Numa altura de extrema sensibilidade e instabilidade política coincidente com o brexit, o governo italiano parece estar a desafiar as regras da Comissão Europeia no que respeita a ‘deficiente’ construção da União Bancária, obrigando-a a tomar decisões que vão ter implicações determinantes para o futuro”, detalha a equipa de research do BiG, ao Dinheiro Vivo. 
Este ignorar de regras é um pau de dois bicos: “Caso Bruxelas decida quebrar as regras de resgates à banca que entraram em vigor este ano, deixando o Estado italiano participar no resgate (…), isso poderia aliviar o stress sobre os bancos, mas iria enfraquecer a credibilidade nas regras e o tecido político de Bruxelas, exacerbando o discurso anti-bancos e reforçando as forças mais radicais.” 
Mas o caso fica pior, pois não quebrar as regras pode ser tão ou mais perigoso. 

“Caso a UE não deixe quebrar (…) poderá haver consequências imprevisíveis e graves seja a nível financeiro, seja político – forçando perdas a acionistas, credores e depositantes, o que poderá gerar um evento de risco sistémico tendo em conta a magnitude do nível de recapitalização” em preparação em Itália. 
E neste impacto sistémico voltamos a encontrar o elefante alemão. 
“Este será o ‘último muro’ até aos riscos/incerteza que pairam sobre o nível de capitalização dos maiores bancos europeus – por exemplo o Deutsche Bank – , o que poderia equivaler a uma espécie de momento ‘Lehman’ para todo o sector financeiro Europeu”, concluem. 

Este pau de dois bicos é também identificado por António Duarte. 
“Seja qual for o plano de recapitalização, os esforços que vão ser feitos vão contaminar toda a indústria financeira que, no curto prazo, tem um impacto negativo”, diz o gestor da XTB, que vê no caso italiano “um conflito de interesses entre a União Bancária e o governo, em que no meio está a proteção de credores”. 

Portugal: Nacionalize-se? 

A dívida portuguesa tem passado ao lado das oscilações nos juros apesar de toda a incerteza, algo que para António Duarte se deve “ao plano de compra de ativos do BCE”, que ainda protege os títulos de variações significativas. 
Porém, também a banca portuguesa está perto do limite, ao ponto de João Queiroz considerar que a salvação já não passa pelo banco para o malparado. 

“No ponto em que se encontra a banca portuguesa, as únicas formas de capitalizar a banca pública é injetar dinheiro público ou privatizá-la. 
Para a banca privada resta a intervenção direta do Estado, com a consequente nacionalização. 
Por muito drástico que este discurso pareça, não acho que seja irrealista”, diz João Queiroz.






















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