Expresso, 23 de Julho de 2016
Se Comissão Europeia e Conselho decidirem sanções, Governo põe processo no Tribunal de Justiça da UE
O Governo está a elevar o tom relativamente a Bruxelas e não vai admitir que Portugal seja sancionado por causa da falta de cumprimento do défice por Portugal em 2015.
No caso da Comissão e do Conselho decidirem fazê-lo, o Executivo vai processar a Comissão e o Conselho Europeu junto do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), uma medida inédita.
Ao que o Expresso apurou, os serviços jurídicos da representação diplomática portuguesa em Bruxelas (REPER) e da Direção-Geral de Assuntos Europeus estão a estudar intensivamente esta questão de modo a que o processo possa ser intentado de imediato.
Depois de na semana passada, o Conselho dos ministros das Finanças ter ratificado a recomendação da Comissão Europeia de que Portugal não tinha tomado “ação efetiva" para cumprir o défice, esta discutiu, na quarta-feira, preliminarmente a sanção concreta a aplicar mas só tomará uma decisão na reunião da próxima quarta feira.
A única hipótese que está, para já, a ser descartada diz respeito a uma multa de 0,2% do PIB.
“A multa não será o valor máximo", disse ao Expresso fonte comunitária.
No caso português, poderia significar uma sanção de 570 milhões de euros. “Circunstâncias excecionais" – como a crise académica vivida em Portugal permitem a Bruxelas tirar o pior cenário de cima da mesa.
Já as restantes opções estão em aberto e não podem, nesta altura, ser excluídas.
Na reunião do colégio de comissários, o vice-presidente, Vaklis Dombrovskis, pôs em cima da mesa várias possibilidades.
Alguns comissários, como Carlos Moedas e o espanhol Arias Canete, defenderam a aplicação de uma “sanção zero".
No entanto, outros membros do executivo comunitário discordam e pedem a aplicação de um valor concreto para mostrar a credibilidade das regras.
Entre as vozes mais duras estarão os comissários alemão, finlandês e a comissária sueca.
Ajuda socialista falhou
Nos meios diplomáticos, especula-se quo a sanção poderá ser da ordem dos 90 milhões de euros, mas - sabe o Expresso — a ideia do Governo é mesmo intentar um processo, se houver lugar a dispêndio de dinheiro por parte de Portugal, já que se considera que, ao contrário do que diz a Comissão e o Ecofin, o Executivo anterior teve uma “ação efetiva” para reduzir o défice.
Antônio Costa está dececionado com Bruxelas, que terá em determinadas ocasiões prometido uma coisa e feito outra, ou feito exigências descabidas.
O Expresso apurou que, mesmo entre os meios socialistas europeus, a “corrente” não terá passado.
E, apesar das palavras favoráveis a Portugal do Presidente francês e do primeiro-ministro italiano acabou por não ter havido uma recusa das sanções, nem por parte da Comissão nem do Ecofin, como o Governo esperava.
Marcelo acredita que o “papão externo” - a Europa das sanções - pode ajudar a manter a “geringonça”
No Ecofin, em particular, não foi possível obter a maioria qualificada para impedir a recomendação de sanções (com a Alemanha e a Áustria a votarem a favor).
O dedo é também apontado ao presidente do Eurogrupo, o holandês Jeroen Dijsselbloem, que terá quebrado o consenso de não se falar em sanções nas declarações públicas posteriores à reunião.
Certo é que nos últimos tempos o primeiro-ministro tem aumentado o tom das críticas à Europa e o discurso pessimista adotado na última reunião com os deputados do PS também é disso revelador.
"Estou preocupado com a Europa, o seu funcionamento e a incapacidade de responder às crises. As atuais políticas europeias conduzem à estagnação, medo e populismos xenófobos ou nacionalistas". comentou ao Expresso.
Marcelo e Costa “articulam-se" contra a crise
Marcelo Rebelo de Sousa está preocupado com a eventualidade da esquerda “não aguentar”, e com o que Costa terá de fazer no próximo Orçamento para serenar Bruxelas, e convocou os partidos para irem a Belém na próxima segunda-feira, para lhes “tomar o pulso” ainda antes das férias.
E, ao que o Expresso apurou, na última reunião semanal com o primeiro-ministro articularam uma aparente convergência de pontos de vista contra a crise.
“Oxalá resulte”, comenta-se em Belém.
A convicção nos meios presidenciais é que, ao contrário do que diz o PSD, Costa tudo fará para evitar uma rutura na “geringonça” no outono.
Reconfortado com sondagens que favorecem o PS e com o impacto positivo que o "papão” externo - a Europa das sanções parece ter internamente (quer ajudando a manter a esquerda unida, quer cativando eleitores), o PM preferirá continuar a tempo em vez de partir já para uma crise e terá assim serenado os temores do Presidente.
Algumas soluções para Costa tentar acalmar o PCP foram analisadas e a reabertura da negociação colectiva pode ser, ao que o Expresso apurou, uma saída à mão.
Não custa dinheiro e agrada aos sindicatos.
Talvez ajude.
Marcelo continua a acreditar que o mais provável é a “geringonça” não quebrar, mas espera pela próxima semana para ter uma noção mais clara das reais intenções e cada um.
Sobretudo porque BE e PCP exigem aumentos salariais já no próximo Orçamento de Estado.
As dúvidas do PR estão muito focadas no próximo OE e nas garantias que António Costa deu a Bruxelas e que está disposto a “fazer tudo” para manter Portugal fora do incumprimento.
“Vamos ver se a esquerda aguenta”, eis a dúvida de Belém.
Quinta-feira, no Algarve, o Presidente da República disse não esperar uma crise.
Mas quando se fala dela …
Com SUSANA FREXES
Correspondente em Bruxelas
Imeireles@expresso.impresa.pt
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